Em viagem ao Butão, brasileira faz trekking e mergulha na cultura do país

O relato da vez é da leitora Beatriz Pianalto de Azevedo, que viajou ao Butão em novembro de 2011. Lá, fez trekking até as imediações de Jomolhari, a 6ª maior montanha do país (7.134 m).

Desta vez, deixarei que a própria Beatriz se apresente:

“Tenho 67 anos e, a partir dos 50, cansada do tal de ‘sexo, drogas e MPB’, troquei os anos loucos pelas deliciosas e saudáveis viagens de aventura por este mundão cheio de porteiras.

Desde então tenho feito trekkings em alta montanha, subindo picos de 6 mil metros, tanto nos Andes quanto no Himalaia (minha última incursão foi em janeiro, subindo o Toubkal, montanha de 4.167 metros no alto Atlas em Marrocos), canionismo, o que exige rapeis em cachoeiras que vão de 10 a 100 metros de altura, um pouco de cicloturismo e viagens de carro Brasil adentro.”

Em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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A primeira vez que ouvi falar no Butão foi em 2009 quando meu otorrino escandalizado perguntou “mas tu não conheces o Butão?!!” Em 2011 decidi conhecer este país asiático e tão encantada fiquei que retornei em 2014.

Não é tarefa simples chegar ao Butão porque a única companhia de aviação que opera no país é a Druk Air, cujos voos se limitam a Índia, Tailândia e Nepal. Eu contratei diretamente uma das muitas agências existentes no país, que organizou tudo pra mim.

Assim, depositei o valor das passagens de avião (ida e volta Katmandu-Paro) mais o valor referente ao tempo de permanência (17 dias), que cobriu desde trekking, hotéis, refeições, guias, veículos, ingressos em parques, traslados e até água mineral.

Escolhi voar via Katmandu, capital do Nepal, já que conhecera o país em 2010 por ocasião de trekking ao Mera Peak. Durante o voo, dei a maior sorte em ir sentada no lado do avião que me permitiu ver Everest e Kangchenjunga, 1ª e 3ª montanhas mais altas do planeta.

O reino do Butão, menor que o estado do Rio de Janeiro, está espremido entre China ao norte e Índia ao sul. Seu relevo montanhoso, cortado pelo Himalaia, exibe extensas florestas de coníferas, enfeitadas na primavera por coloridos rododendros. Já no outono, o verde das folhagens é quebrado por tons de vermelho, laranja e amarelo típicos desta estação.

A religião oficial é o budismo, introduzido no século 7 d.c. pelo indiano Guru Rinpoche, e a população não ultrapassa 900 mil habitantes. Para fins administrativos, o país divide-se em 20 distritos (equivalentes a estados), e sua capital, Timfu, é também a cidade mais populosa, com 115 mil almas.

A partir do século 20 a teocracia budista, que até então governara, cedeu lugar ao poder laico, representado pela dinastia Wangchuck. No início do século 21, a última monarquia absolutista do planeta transformou-se numa monarquia constitucional. O país, com isso, sela, em definitivo, seu novo status democrático, conclamando eleições em 2008.

Tais ousadias limitam-se, entretanto, ao campo político, já que as tradições mais ortodoxas do budismo permanecem zelosamente preservadas. Prova disso é o fato de serem ainda os monges os responsáveis pela escolha dos nomes das crianças recém nascidas.

A agricultura de subsistência e a pecuária são os meios de vida de 90% da população. Tanto a arquitetura quanto o vestuário são tradicionais, não fazendo concessão ao estilo ocidental.

A preservação ambiental no Butão é levada super a sério: para cada árvore derrubada, o cidadão tem de plantar outras em substituição. Dois são os esportes nacionais: o popular doego, jogo similar à pelota, usando-se, contudo, pedras achatadas, e o refinado arco e flecha.

O sistema penal contemplou até o reinado de Jigme Dorgi, avô do atual rei, a pena de morte. Uma delas consistia em afogar os criminosos, atirando-os aos rios com mãos e pés atados, carregando às costas um cordão de pedras.

O butanês não fuma muito tabaco, mas, em compensação, adora mascar dhoma, um tipo de noz, semelhante à noz moscada, envolta em folhas largas e verdes de bétula cujo odor é bem desagradável.

Trekking

Como gosto de aliar as atividades esportivas às culturais, comecei pelo popular trekking que vai até as imediações de Jomolhari, a 6ª maior montanha do país (7.134 m).

Na expedição, que durou 8 dias, tive como companhia apenas a equipe: o guia Jigme, o condutor de animais Wangyel, o cozinheiro Sonam e Nidup, pau pra toda obra. O equipamento foi todo carregado em lombos de mulas.

Como era outono [novembro de 2011], predominou céu cinzento, muito frio e queda de neve, embora tenha feito um par de dias ensolarados. Todos os pernoites foram em barraca porque não havia pousadas ao longo do caminho —as poucas casas existentes pertenciam a camponeses.

As refeições, 3 por dia, eram saborosas e fartas. A caminhada começou nos arredores de Paro e terminou no mesmo lugar de onde partimos: uma forte nevasca impossibilitou que atravessássemos o passo Yali La, de modo a permitir que a pernada findasse em Timfu.

O trajeto inicial se deu numa trilha aberta na floresta de pinheiros ao longo do sinuoso curso do rio Paro, cujas águas de coloração turquesa eram um deleite aos olhos.

No 3º dia, saímos da floresta e entramos nos vales de Takethang e Dangochang, limitados por montanhas cujas encostas superiores estavam pintalgadas de neve.

A exuberância da vegetação cedeu lugar a uma paisagem econômica onde só cresciam arbustos de pequeno porte. No solo coberto por gramíneas, rebanhos de yaks pastavam aqui e acolá.

Conforme ganhávamos altitude, menos impetuoso se tornava o rio Paro, adquirindo ares de quase languidez se comparado ao frenético turbilhonar de sua correnteza quando rasgava a floresta nas partes menos elevadas.

Acampamos 2 dias em Jangothang (4.080 m), aos pés do pico principal do Jomolhari, que se manteve escondido por espessa neblina. Somente na volta, no 6º dia, finalmente consegui avistá-lo, coberto de um manto espesso de neve.

Cultura

Terminado o trekking, iniciei a parte cultural da viagem, pernoitando agora em hotéis confortáveis. Como meio de transporte, o confortável SUV Hyundai, dirigido pelo motorista Pema, mais a companhia do falante guia Jamyang.

O primeiro destino foi Timfu, onde pernoitei. Situada num vale, rodeado por montanhas, a cidade, ainda que ostente construções antigas, está se modernizando a toque de caixa.

Limpa, bem organizada, denotando certo cuidado no planejamento urbanístico, suas construções —a maioria edifícios de 4 pisos— obedecem ao padrão arquitetônico butanês.

O burburinho de fim de tarde é o mesmo em todas as cidades do planeta e Timfu não foge à regra. Considerando que a altitude dos lugares visitados não extrapolou os 2 mil metros, os dias foram agradavelmente ensolarados.

No dia seguinte iniciei meu tour cuja cereja do bolo foi assistir a um festival budista no distrito de Bumthang. Embora a distância fosse de apenas 280 km, a viagem durou 2 dias, com pernoites em Phunakha e Trongsa. A estrada, cheia de curvas, corta encostas de montanhas atingindo em certos passos altitude superior a 3 mil metros.

Butão é muito colorido, não só pela paisagem, vestuário de seu povo ou interior dos mosteiros, como pela farta quantidade das bandeiras de orações tremulando nas pontes, ao redor das stupas e nos passos de montanhas.

Conheci os imponentes dzongs ou fortress, prédios enormes, altos e quadrados, pintados de branco, que funcionam como sede administrativa dos distritos e residência dos monges. Alguns estrategicamente construídos à beira de rios e penhascos ou no topo de colinas, como os de Punakha, Trongsa e Paro.

Inesquecíveis as deliciosas paradas para beber chá em terraços de restaurantes donde se avista o cenário luxuoso dos Himalaias e seu cordão de montanhas nevadas, uma ao lado da outra, em absoluta visibilidade.

Em Bumthang, onde permaneci 2 dias, além de visitar os monastérios Tamshing Monastery, datado de 1501, e Kurje Lhakhang, onde se encontram impressões do corpo de Rinpoche, assisti ao festival budista Jambay Lhakhang Drub.

Dentre as apresentações, a mais marcante foi a dança dos homens nus, à meia-noite, iluminados pela luz da fogueira acesa no meio da arena por onde eles desfilavam ao redor do círculo formado pelo público.

Nus em pelo, exceto pelos rostos enfaixados à semelhança de múmias, homens e meninos, muito à vontade, tocavam em seus membros e provocativamente davam barrigadas de modo a encostar seus membros nos espectadores. Infelizmente, fotografias e filmagens foram proibidas durante o espetáculo.

Encerro a viagem visitando, em Paro, Tiger Nest, o monastério cartão-postal do Butão. A trilha, bordejando um abismo, atravessa bosque de pinheiros. Após 50 minutos de caminhada, eis encarapitado a 2.900 metros sobre pequeno platô de montanha, à beira dum precipício, a magnífica construção cujos 4 templos são coloridamente decorados, conforme reza a tradição budista.

A caminho do aeroporto, agradeço intimamente: kardincheyla, gentil povo butanês!

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Aviso aos passageiros 1: Outro país que também está fora do circuito turístico, mas que tem uma rica cultura, é o Laos. Relembre o que o professor universitário Wagner Belinato escreveu sobre o lugar

Aviso aos passageiros 2: O leitor Luís Paulo dos Santos contou ao blog como foi viajar à China e deu dicas de como se virar no país asiático