Check-in https://checkin.blogfolha.uol.com.br Relatos de turistas, dicas e serviços de viagem Wed, 01 Dec 2021 12:49:26 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Subir ao Auyantepui, na Venezuela, envolve dias de trekking e de rapel https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/06/16/subir-ao-auyantepui-na-venezuela-envolve-dias-de-trekking-e-de-rapel/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/06/16/subir-ao-auyantepui-na-venezuela-envolve-dias-de-trekking-e-de-rapel/#respond Wed, 16 Jun 2021 18:15:25 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/2º-Dia-de-Trekking-Face-sul-do-Auyantepui-1-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=752 Em meio a várias histórias de quem viaja de carro por aí, trago um relato de trekking de muitos dias para chegar ao Auyantepui, um dos muitos tepuis –formação ao estilo mesa– da Venezuela.

Quem nos conta a experiência é a leitora Beatriz Pianalto de Azevedo, que já escreveu ao blog sobre suas viagens a Guiné-Bissau e ao Butão. A última história dela, inclusive, também envolveu uma longa expedição, mas ao ponto mais alto do Brasil, o Pico da Neblina.

Em tempos de coronavírus nossas viagens ficaram mais restritas. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Início da expedição

A Venezuela detém a maioria dos tepuis do planeta: 115, sendo que a maioria se localiza no Parque Nacional Canaima, destacando-se o Auyantepui, Kukenan e Roraima. O restante dos 140 estão distribuídos pela África, Austrália, Colômbia, Uruguai, e, no Brasil, os mais belos exemplares estão no Jalapão (TO), Chapada das Mesas (MA) e Livramento (RS). 

Decidida a enfrentar o Auyantepui (o Roraima conhecera em 2011), contrato uma agência venezuelana e me mando no feriado de Carnaval de 2016 para Caracas, onde conheço os demais membros da expedição, oito europeus. De Caracas voamos a Puerto Ordaz e dia seguinte vamos de busão a Ciudad Bolivar, onde nos esperam três avionetas do tempo de Saint-Exupéry. 

Uma das avionetas que levaram o grupo de Ciudad Bolívar à aldeia pemone Uruyen (Arquivo pessoal)

Aqui já começa a aventura na balouçante aeronave. Após 50 minutos de voo, a vegetação rasteira de savana cede lugar à espessa vegetação da floresta amazônica. De repente, na paisagem plana, os tepuis começam a aflorar, espocando tal qual pipoca no solo. Majestoso é pouco para descrever a belezura desse tipo de elevação, em forma de mesa, com paredes verticais, cuja altura varia de 2 mil a 2.900 metros. 

A avioneta nos deixa em Uruyen, uma das tantas aldeias indígenas pemones, existentes no parque, onde pernoitamos. A paisagem que se desfruta de qualquer lugar donde se esteja é a da magnífica face sudeste do Auyantepui e de suas encostas revestidas de vegetação. 

Com altas muralhas formando recortes variados, sua superfície alcança 700 km², motivo por que é de longe o maior de todos os tepuis existente no planeta. A expedição conta, além dos três guias, com 18 pemones que transportam, nas costas, em cestas de vime bagagens e equipamentos. 

1º dia de trekking

Deixamos a aldeia Uruyen e após curta pernada saímos da savana, iniciando a ascensão do Auyan. Circundando a sua face sul, há três extensos platôs rochosos, formando como que gigantescos degraus que antecedem o topo. 

Hoje subiremos até a 1ª plataforma. Percorremos uma mata relativamente cerrada e desembocamos no espaço aberto do cobiçado platô, após ardida subida. A recompensa é a encantadora visão de pedras cobertas por musgos e líquens, arbustos, flores, sombra e água fresca. 

Almoçamos no alto da plataforma tendo aos nossos pés o vale Kamarata. O caminho então se torna moleza: suave descida sucedida por trecho plano até o acampamento Guayaraca (1.011 m). Com a escuridão já quase instalada, tem início o show de luzes dos pirilampos.

2º dia de trekking

A trilha plana alterna trechos de savanas e bosques. Dissipada a cerração, o sol brilha no céu. Mimetizada entre raízes e folhas, uma enorme cascavel, toda enrodilhada, de sentinela no meio da trilha. Dum riacho recolhemos água para enfrentar a subida até o topo da 2ª plataforma, quase uma escalaminhada, donde se tem uma visão estupenda da avermelhada face sul do Auyantepui.  

A ascensão, no meio da estreita picada, aberta na floresta, é inclinada para caramba. O guinchar dos macacos é perfeitamente audível, assemelhando-se, pasmem, a rajadas de vento. A subida continua pois temos de alcançar a metade da 3ª plataforma onde acamparemos. 

Vencidas outras tantas escalaminhadas, feitas com cuidado, porque há largas fendas entre as pedras, chegamos enfim ao acampamento El Peñon (1.870 m). No final da tarde, o sol ao se pôr colore de dourado a parede do tepui. Após a janta, maior silêncio no acampamento, apenas o movimento dos pirilampos inundando a mata de inúmeros pontos luminosos. 

3º dia de trekking

Hoje é dia de alcançarmos o topo do Auyan. A base da parede sul do tepui é pedra sobre pedra cercada de mata por todos os lados, daí por que a caminhada é pura escalaminhada. Em retrospecto, a subida ao topo do Roraima foi moleza! A neblina dá uma pausa e permite que se avistem os gigantescos totens de pedra que guardam a trilha. 

A partir do paredão, sete ascensos exigem cordas até o topo. Um mundo de indescritível beleza atravessa blocos gigantescos de rocha entremeados por exuberante vegetação. Quando a névoa se dissipa um pouco, se avistam espaços vazios entre os blocos de arenito. Num desses, apelidado de Callejón de las Palomas, se escuta o arrulhar de centenas de pombas que fazem do buracão seu ninho. 

A fatigante subida entre as colossais torres acaba de repente. Já estamos no topo, avisa Fred, o líder dos guias. Refeita da emoção, percebo duas muralhas dispostas perpendicularmente uma à outra.  A que importa é a 2ª, que dá acesso ao ponto donde desceremos, rapelando, um paredão de 1 mil metros. 

Um mundo totalmente inédito o topo do tepui. Ao contrário do Roraima, surpreende pela quantidade de bosques e pela coloração mais clara dos maciços rochosos. Almoçamos à beira do rio Naranja e ao chegarmos ao acampamento El Oso (2.165 m), no meio da tarde, o céu está desanuviado. 

À noite, quando as caprichosas nuvens permitem, se vêem zilhões de estrelas no firmamento. 

4º dia de trekking

Nosso próximo destino é o acampamento Dragon. Inicialmente caminhamos por uma superfície rochosa plana. Apenas dois trepa-pedras envolvem certas habilidades para transpô-los. 

O céu ora ensolarado ora nublado. Entramos numa mata fechada, cheia de sinuosas curvas, um sobe e desce ininterrupto conhecida como labirinto. A floresta é linda com arbustos e árvores hospedando em seus troncos variedades de bromélias. 

De repente, numa dobra da mata, uma visão extasiante: cercado por margens cuja areia é rosada, as douradas águas do rio Churun, onde nos banhamos. A poucas centenas de metros o maciço paredão da 2ª muralha. 

Chegamos ao acampamento Dragon (1.765 m), no meio da tarde. Da minha barraca, escuto o conversê dos guias mas nem eles tampouco os pemones fazem frente à tagarelice dos belgas, imbatíveis na charla! 

5º dia de trekking

Como de costume, o dia amanhece nublado. Escuto a 20 metros da barraca o barulhinho gostoso da correnteza do Churun. A passarada assanhada não para de trinar. Deve estar, no mínimo, curiosa com nossa movimentação, afinal Auyantepui não é point turístico bombado como o Roraima. 

A escalaminhada em paredão exposto até o topo da 2ª muralha mostra-se bem ríspida. Mas a beleza do mundo encantado das pedras e dos musgos suplanta qualquer cansaço. 

Quando terminamos a subida e alcançamos o topo da 2ª muralha, as dificuldades não param. Tudo porque temos pela frente quilômetros de terreno fofo coberto de areia e material orgânico, seguindo-se um solo pantanoso quando entramos em úmidos bosques. 

Após hora e meia de pernada, aleluia, chegamos a uma baixada onde se encontra o acampamento Neblina (1.820 m). 

6º dia de trekking

Eeebaaa, hoje as subidas nem são lá muito puxadas. O espesso matagal de samambaias acaba num terreno coberto por lajes, livre de vegetação. Após breve descanso, a pegada é encarar o interior dum bosque escuro, atravancado de troncos e galhos de árvores caídos no chão desnivelado que alterna baixadas e subidas. 

Tudo muito úmido, tornando o solo em certos trechos uma meleca pantanosa. No início da tarde, já estamos no acampamento Kerepa, fincado à margem do rio de mesmo nome.  Por causa do mau tempo, fico na barraca lendo. 

7º dia de trekking

Embora o trajeto seja curto, dura é a distância até o acampamento Salto Angel neste último dia de caminhada. Semelhante a de ontem, a trilha se dá no mesmo tipo de bosque cerrado, escuro e úmido, com subidas e descidas lamacentas. 

Louquíssimo o trecho de selva onde espessos musgos de coloração ferruginosa recobrem troncos e galhos de árvores. De repente, nos livramos do matagal e entramos num campo coberto de gramíneas, vencendo sem esforço uma curta ladeira, após o que alcançamos, enfim, o acampamento Salto Angel, montado também à margem do rio Kerepa. 

À tardinha, nos acomodamos ao redor da fogueira, providencialmente acesa pelos porteadores, pois um arzinho gelado paira no topo do tepui. À noite, reina o maior silêncio no acampamento, já que amanhã levantamos às 4 horas para enfrentar o restante da aventura. 

Os dois dias de rapeis 

A partir de hoje, nossa pernada será diferente: enfrentaremos dois dias de rapeis numa parede de quase mil metros, pouco distante do Santo Angel, terminando a aventura no rio Churun. 

Nos seis primeiros rapeis a descida se dá em parede quase desnuda de vegetação. Já os 7º e o 8º rapeis são feitos em meio a arbustos. Para chegar ao ponto do 6º rapel, somos becapeados a improvisado corrimão de cordas antes de percorrermos os 20 metros do estreito platô, limitado à esquerda pelo despenhadeiro de 700 metros de altura. 

Embora este rapel seja o pior de todos, com 90 metros de exaustiva descida, sou recompensada quando, num lance negativo, a corda me faz girar 180º, permitindo que eu dê as costas à parede e veja aos meus pés o cenário sensacional do canyon del Diablo cortado pelo rio Churun. 

Quase no final da tarde, chego ao acampamento Cueva, um largo platô encimado por um baita teto de rocha onde bivaqueamos. Deitada, aprecio o sol iluminar a parede leste do tepui, acentuando a coloração rósea de sua rocha. 

Um dos vários momentos de rapel na expedição (Arquivo pessoal)

Após a emocionante descida de 475 metros, eis diante de meus olhos, a poucos metros, o Salto Angel! 

Faltando ainda 500 metros de baixada, dia seguinte, realizamos outros sete rapeis, todos em meio ao matagal. Cada vez mais perto do leito do rio Churun, já escuto seu rumorejar. 

Não tinha ideia de que a aparente verticalidade da parede -vista de fora- particularmente nestes 500 metros finais, comportasse tantas plataformas, algumas com capacidade de acomodar 20 e tantos viventes, bem como trechos onde se pode caminhar sem necessidade de rapel. 

Terminados os rapeis, uma caminhada numa baixada hiper íngreme e resvaladiça até o mirador do Salto Angel. Chegamos à tardinha a Isla Ratón onde pernoitamos num dos muitos refúgios ali existentes. 

Construída à margem esquerda do rio Churun, na rústica habitação, uma dezena de redes serve como cama. Após a janta, deitada na rede e embalada pelo toin toin toin das gotas de chuva tamborilando no teto de zinco, penso cá com os meus botões: terminou o que era doce, quem desceu o Salto Angel se arregalou!

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Aviso aos passageiros 1: Se você gosta de aventura e altura, pode se interessar pelo relato do alpinista e escritor Thomaz Brandolin, que contou como foi escalar o Monte McKinley ou Denali, o ponto mais alto da América do Norte

Aviso aos passageiros 2: O Check-in também tem o relato do escritor Marcelo Lemos, que subiu ao topo do Kilimanjaro, o ponto mais alto da África

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Policial aposentado viaja de ônibus pela América Latina com mochila nas costas https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/11/11/policial-aposentado-viaja-de-onibus-pela-america-latina-com-mochila-nas-costas/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/11/11/policial-aposentado-viaja-de-onibus-pela-america-latina-com-mochila-nas-costas/#respond Mon, 11 Nov 2019 13:37:51 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2019/11/15734230985dc887faf3953_1573423098_16x9_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=168 Muita gente acha que viajar com uma mochila nas costas ou enfrentar perrengues fora de casa é coisa de “jovem sem juízo”. Samuel do Lago está aí para mostrar que não é bem assim.

Como ele começou a trabalhar cedo, aos 8 anos, teve a oportunidade de se aposentar aos 50.

Em um primeiro momento, o policial aproveitou a aposentadoria precoce e passou 13 meses na estrada, viajando pelo Brasil.

Depois, aos 52 anos, voltou a colocar a mochila nas costas para desbravar a América Latina, de ônibus. E foi nessa idade que ele descobriu o mundo de hospedagem em hostels.

Fez alguma viagem recentemente e quer compartilhar sua história? Mande seu relato para blog Check-in pelo email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Aos cinquenta anos já estava aposentado. Parece cedo, mas comecei a trabalhar aos oito. Não tive acesso, nos momentos ditos convencionais, a parte das brincadeiras de criança e quase todas as aventuras que os jovens fazem.

A aposentadoria expôs a fragilidade de um casamento que se arrastava e, com o divórcio, decidi começar tudo de novo.

Perigosamente livre, tive que reunir forças para encontrar o equilíbrio emocional que a profissão e o casamento tinham fragilizado e viajei para o interior paulista para refletir sobre o que faria da vida.

Estava dentro de um hotelzinho barato, após perambular pelas cidades próximas a Rio Claro, quando um amigo me ligou de Salvador informando que na emissora em que trabalhava precisavam de um repórter com o meu perfil. Imediatamente fechei a conta, voltei pra casa, arrumei as malas e fui. De mudança.

Recomeçar a vida numa cidade festiva como a capital baiana era tudo o que o novo solteirão da praça precisava. Mas de bom mesmo foi só a coragem que o convite deu para mudar de estado, pois ao chegar em solo soteropolitano a possibilidade de emprego não se concretizou. Ao menos ganhei o impulso necessário para realizar um antigo sonho que era conhecer todo o país. E assim, durante 13 meses e nove dias, percorri, literalmente, do Oiapoque ao Chuí.

Samuel quis viajar de ônibus pelas Américas para conhecer geograficamente o percurso (Arquivo pessoal)

Ao retornar a São Paulo, sem casa, sem mulher, mas com doze irmãos, fui para casa de um deles e permaneci lá durante os festejos de final de ano. Depois, fui morar em Resende (RJ), onde havia passado minha infância.

Lá, aluguei uma casa do século 19, de quase 300 m², onde ocupava o tempo escrevendo o livro sobre a viagem pelo Brasil.

Havia passado nove meses e a monotonia de uma cidade interiorana me incomodava, mas não tinha verba o suficiente para uma nova jornada. Contudo, o tédio me deu ousadia. Imaginei: se sobrevivo aqui com a pouca renda que tenho, também consigo por lá, basta ter o dinheiro extra das passagens de ônibus. E assim comecei a pôr em prática o planejamento de uma viagem pela América do Sul mochilando.

Fui a uma loja da cidade, comprei um saco de dormir e alguns acessórios básicos, passei em São Paulo para me despedir da família e segui viagem no dia 1º de setembro de 2012, aos 52 anos.

Da capital paulista fui para o Paraguai.

A opção de fazer todo o percurso até a Venezuela de ônibus era motivada pela minha resistência a avião e pela oportunidade de conhecer geograficamente o percurso.

Depois de viajar toda a noite sem pregar os olhos, ansioso, imaginando o que aquela aventura me reservaria, cheguei sonolento pela manhã na rodoviária de Assunção. Ao fazer o câmbio, percebendo minha desatenção, consideraram os cem dólares que pedi para trocar por guaranis como sendo reais e, assim, meus parcos recursos foram desfalcados.

Seria minha primeira experiência me hospedando em hostel, o que criava uma certa expectativa, mas logo descobri que o ambiente é uma extensão da própria casa. A diferença é a convivência diária com pessoas de nacionalidades e culturas diferentes, além de dormir no mesmo quarto com elas.

Embora nunca tivesse estudado espanhol, foram cinco dias em solo paraguaio com passeios e conversas agradáveis, mesmo com a limitação da língua.

Finalizei minha visita ao Paraguai com uma cantoria com a família da proprietária do hostel que, inevitavelmente, inclui “Galopeira” no repertório.

O destino seguinte foi o Uruguai e, embora já me sentisse confortável no papel de aventureiro e me considerando com alguma experiência em hostel, ainda assim não foi suficiente para escolher a cama: todas estavam ocupadas e só me restou a parte de cima de um beliche no meio do quarto.

O desconforto não prejudicou o convívio com os hóspedes, que foi enriquecedor. Tinha italiano, português, chileno, colombiano e, naturalmente, uruguaios.

Nícolas, um dos quatro irmãos que ajudavam o pai, proprietário, foi quem me recebeu. Para mostrar sua generosidade na hospedagem, me ofereceu uma cerveja enquanto falava do seu país. A atitude foi tão significativa que, dois anos depois, os recebi em minha casa, em Resende.

Ficar à vontade naquele ambiente festivo favoreceu para que eu praticasse o espanhol e entre tantas palavras aprendidas, chamou-me a atenção o quanto demorei para aprender que “ayer” significava “ontem”.

Uma semana depois já estava na Argentina e, sete dias depois, no Chile.

Dos dias em Santiago, impressionou-me ver todas as casas com a bandeira do país. Era semana da pátria e, embora fosse por força de lei, uma chilena disse que mesmo que não fosse obrigatório eles fariam, por amor e respeito ao país. Achei bonito o patriotismo.

Rumo a Oruro, na Bolívia, pernoitei no deserto chileno de Atacama. Das hospedagens, ao final da viagem, classifiquei como a pior.

Como das vezes anteriores, já havia pesquisado pela internet onde ficaria, mas encontrar duas paulistas no ônibus trouxe um pouco do alento de estar entre os meus e, por isso, decidi mudar a opção para acompanhá-las no hostel Mamut.

O calor e cerca de dez beliches todos ocupados, num quarto onde ficavam homens e mulheres, só não foi pior porque restou-me um colchão de casal, no chão, onde tentei dormir.

Perto de uma da madrugada chegou um cidadão tropeçando nas coisas e procurando sua cama. Acomodou-se na parte de cima do beliche em que estava uma das paulistas. Me pareceu embriagado. Nem bem deitou e começou a roncar. Ronco alto. Intercalado por flatulências no mesmo volume. Foi desconcertante, mas não tinha pra onde ir, já estavam todas as dependências ocupadas. Então restou-me esperar que a noite não fosse tão longa.

Ao amanhecer, conversando com a brasileira que dormiu no mesmo beliche do rapaz inconveniente, confidenciou-me que sentia um mau cheiro, mas estava tão cansada que não conseguiu acordar.

A altitude que já sentia no Atacama só aumentou ao passar por Oruro e La Paz, na Bolívia, Cusco e Machu Picchu, no Peru, e Quito, no Equador. Ao chegar à colombiana Bogotá já me sentia ambientado.

No trajeto de Cusco para Machu Picchu, tomei vários comprimidos, mas não foram suficientes para conter o aumento da pressão arterial. Aproveitei-me da companhia de um médico cubano, que dividia comigo a poltrona do trem, na esperança de uma solução para o meu problema. Após contar a quantidade de comprimidos que havia ingerido, limitou-se a dizer que era “demasiado”.

A escolha da poltrona

Na hora de comprar as passagens, fazia a escolha da poltrona repetindo o hábito adquirido na viagem pelo Brasil de sentar-me na de número 24.

Por ficar no centro do ônibus e no corredor direito, intuí que se houvesse um acidente, batendo de frente ou por trás, sofreria um impacto menor. Se fosse pela lateral também, já que estava do lado oposto ao tráfego. E, por fim, também me livraria do incômodo de sentir necessidade de ir ao banheiro e ter que acordar o passageiro ao lado.

Todavia essa técnica não fez nenhum sentido no trajeto de Cusco para Lima. A viagem de quase 24 horas transcorreu por rodovias tão perigosas que um acidente livraria apenas quem não estivesse embarcado.

Na saída do Equador e entrada na Colômbia experimentei o desconforto de ter que encarar o motorista do táxi, que queria superfaturar em quase cinco vezes a corrida, apenas pelo fato de ter saído duas quadras do itinerário, para sacar dinheiro num caixa eletrônico. Ainda assim acabei pagando o dobro do combinado, mas com a sensação de que corria risco em terra estranha.

Samuel do Lago em frente à placa da Colômbia (Arquivo pessoal)

O outro perrengue se deu na chegada à Venezuela.

Troquei os poucos pesos colombianos que tinha por bolívares e, ao chegar a San Cristóbal, me dirigi a um hotelzinho popular ao lado da rodoviária, paguei o pernoite, deixei minha mochila e fui sacar dinheiro, mas não consegui nos três únicos caixas que havia na cidade. Então restou-me apenas o dinheiro do jantar e, para o dia seguinte, teria que buscar solução para seguir a Caracas.

Salvou-me o contato virtual com uma venezuelana, residente na capital. Pela manhã, lhe falei sobre minha dificuldade e ela começou a buscar na cidade alguém que pudesse me ajudar, já que estava a cerca de oitocentos quilômetros.

Na hora do almoço, a fome veio acompanhada da insegurança de estar onde não conhecia ninguém, longe de casa. Então tive que potencializar meu limitado talento para ator e representei uma fome de quem não comia havia um mês. “Yo tengo hambre”, “Tengo plata, pero cachero no acepta mi tarjeta”. O timbre grave e o tom de voz em pânico mereceu o alento de uma senhora, que aguardava na recepção do hotel seu esposo descer.

– Calma, señor, que pasa? Lhe explicava quando o esposo chegou. E assim ela lhe convenceu a me dar uns trocados.

Repeti a cena com o dono do restaurante, pois o dinheiro não era suficiente, e consegui um prato de comida.

Eram três da tarde quando chegou uma senhora distinta, com seu filho pequeno, e me levou de carro até a rodoviária, comprou-me a passagem e ainda me ofereceu uns trocados para eu comer na viagem. Era a esposa de um político local que a minha amiga virtual contatou. Depois descobri que a minha conhecida era influente politicamente no país.

Minhas despesas eram muito controladas, não permitia qualquer exagero, pois poderia faltar no momento seguinte.

Ao todo, Samuel do Lago já visitou 34 países (Arquivo pessoal)

No Chile, próximo ao hostel que me hospedara vi numa placa “Minuta a lo pobre”. Chamou-me a atenção o nome e o preço. Pedi informação ao garçom e ele explicou que o prato de arroz, bife, ovo, batata frita e salada era bem servido. “Los pobres comen largo”, explicou. Ali fazia todas minhas refeições. Tomava o café da manhã que era oferecido no preço da diária do hostel e protelava ao máximo o horário do almoço, para pular o jantar. Mas a possibilidade de ficar também sem o almoço em San Cristóbal me desestabilizou emocionalmente.

No trajeto para Caracas, já com clima nostálgico de quem finaliza a viagem, fiz um balanço, refletindo sobre tudo que havia experimentado e, ao desembarcar do ônibus, fui direto ao caixa eletrônica. Desta vez tive outra grande surpresa que mudaria a história da viagem. Ao verificar o saldo, descobri que tinha dinheiro para dar a volta ao mundo, se quisesse. Assustado com o equívoco que o banco poderia ter cometido, falei com meu irmão, em São Paulo, e fui informado que aquele valor se referia a uma ação judicial trabalhista que havia ganho. Alegre, devolvi o dinheiro que a amiga emprestou e ainda lhe ofereci um almoço que, para a minha surpresa, ficou num valor quase equivalente a todas refeições que tinha feito na viagem, por conta dos vinhos.

Ânimo revigorado, avaliei que nunca estivera tão perto do México, por isso seguiria viagem. E assim entrei na América Central, percorrendo todos os países até chegar à terra dos maias, numa viagem que durou três meses e na qual colecionei muitas emoções, porém diferentes das que tinha vivido ao longo dos 30 anos trabalhando como policial em São Paulo. A experiência foi tão envolvente que pouco tempo depois já estava novamente em viagem. Desta vez pela Europa. Somando as viagens anteriores, atingi a marca de 34 países visitados.

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Aviso aos passageiros 1: Outro brasileiro que está viajando pela América Latina é o Guilherme Valadão, que relatou como foi viajar de bicicleta por Brasil, Colômbia e Venezuela

Aviso aos passageiros 2: O casal Alessandra e Leo também estão rodando pela América Latina, mas de carro. Aqui, eles contam por que adotaram o acampamento como estilo de viagem

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Há 6 meses na estrada, engenheiro viaja de bike por Brasil, Colômbia e Venezuela https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/10/11/ha-6-meses-na-estrada-engenheiro-viaja-de-bike-por-brasil-colombia-e-venezuela/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/10/11/ha-6-meses-na-estrada-engenheiro-viaja-de-bike-por-brasil-colombia-e-venezuela/#respond Fri, 11 Oct 2019 13:32:07 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2019/10/image7-300x215.jpeg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=136 Mês passado eu postei aqui dicas do jornalista Ricardo Ampudia para viajar de bicicleta e fugir de roubadas. Alguns leitores se inspiraram e mandaram seus relatos.

Uma das pessoas que me procurou foi o engenheiro Guilherme Valadão (@roteiro0), que está há 6 meses na estrada. Ele partiu de São Luís (MA), cruzou o norte brasileiro e viajou pela Colômbia e Venezuela. Agora, está no Panamá.

Guilherme conta que nunca tinha ouvido falar de gente que viaja de bike, e que um mundo novo surgiu após ler o livro de um cicloviajante. Quem sabe esse relato (ou algum outro do Check-in) não te abra também os olhos para novas experiências?

Você também fez alguma de bicicleta? Ou de carro? Com a mãe, o pai, o cônjuge ou a família toda? Mande seu relato para o Check-in pelo email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Sou engenheiro de produção, com mestrado pela USP, e estava trabalhando como gerente de suprimentos em uma indústria quando decidi, aos 29 anos, viajar de bicicleta. Completei 30 quando estava pedalando na Venezuela com tudo que possuo em uma bike.

Tive a oportunidade de viver em 3 outros países e em 4 estados brasileiros, então viajar era uma opção natural em um momento em que não me sentia mais feliz com a rotina que levava.

Planejava uma viagem “normal”, de mochila, para fazer trabalho voluntário em alguma parte do mundo.

Quando estava pensando nisso, li um livro de um brasileiro que havia viajado de bike, o “Homem Livre: Ao redor do mundo em uma bicicleta”, do Danilo Perrotti. A primeira reação foi: tem gente que viaja assim?

Isso mexeu totalmente comigo. Não dormi muito bem nos dias seguintes e ficava imaginando como seria explorar o mundo dessa maneira. Fui buscar mais informações e vi que há toda uma estrutura de equipamentos para isso, rede de contatos, aplicativos, etc.

Nem tinha bicicleta, mas a chama já estava acesa.

Deixei o trabalho e fui à casa dos meus pais, em São Luís, para me preparar por um tempo, pedalar, testar o que funcionaria melhor para dali sair rumo à América Central, passando pela Colômbia.

A magrela chegou e a primeira etapa foi explicar para meus pais o que faria. Demorou para que entendessem que sairia da casa deles já pedalando, e não que viajaria de avião para algum lugar e levaria uma bicicleta junto.

Já que não tinha uma bike desde que era criança, comecei a pedalar. No início, enquanto fazia 10 km, já buscava o que necessitaria para começar a viagem.

Os 10 km diários foram crescendo, os equipamentos que comprava foram chegando e pouco mais de 2 meses depois estava pedalando quase 100 km por dia, com tudo que considerava suficiente em mãos.

Então era hora de sair.

Início no Brasil

O início é tudo ao extremo. Uma sensação de liberdade nunca sentida antes misturada com uma sensação de incerteza sobre o que está por vir.

No dia de esteria, ao chegar à primeira cidade em que parei após 100 km de pedal, atualizei a rede social que criei para a viagem e logo amigos começaram a me escrever com indicações de onde poderia descansar. Resultado: na primeira noite, fiquei em uma casa não utilizada da família de um amigo de um amigo.

Assim, vi que uma forma de ter apoio seria por meio de conhecidos que estivessem acompanhando a viagem. Nos primeiros dias, por ainda estar relativamente perto de onde cresci, acabei sendo recebido até por amigos de amigos de amigos…

Uma experiência que marcou muito o início da jornada aconteceu logo na primeira semana. Em uma cidade no interior do Maranhão, ao me hospedar com o dono de um restaurante, conversei com um funcionário dali e, falando sobre a viagem, contei que iria para Cachoeira do Piriá (PA), onde não tinha nenhum contato ou informação até o momento.

Ele disse que era de lá e que um irmão me receberia. Mas o problema é que ele perdeu o celular e havia 6 meses que não falava com o familiar. Assim, propus um desafio: ele me daria as informações de como encontrar a casa do seu familiar e eu levaria o seu novo número de telefone. Minha recompensa seria a esperança de ter um local seguro para descansar na cidade.

No fim, encontrei o Seu Zé em Cachoeira do Piriá e os irmãos voltaram a ter contato. Não preciso nem dizer que o Seu Zé me deixou descansar tranquilamente na sua casa…

Colômbia

Cheguei à Colômbia de barco pelo rio Amazonas. Essa era uma viagem que desejava fazer e optei por ir à tríplice fronteira (Brasil – Colômbia – Peru) desta maneira saindo de Manaus. Foram 6 dias subindo o rio para chegar à Amazônia colombiana.

A jornada de bicicleta pelo país vizinho começou em Bogotá. Logo de início vi porque chamam a Colômbia de país do ciclismo. Ali se cruza com ciclistas nas estradas a todo momento. Em locais inimagináveis, no meio de uma montanha, de repente passa um senhor de idade pedalando ao seu lado. Essa cultura reflete em vias preparadas e em motoristas mais experientes para lidar com ciclistas.

A grande marca deixada pela Colômbia na minha viagem foi a da superação. O país é pura montanha, não tem como escapar! E eu, antes viajante que ciclista, que até o momento vinha pedalando somente por lugares planos, de repente me vi cruzando a Cordilheira dos Andes de bike, com mala e tudo.

O início foi sofrido, parava bastante para respirar, já que além da montanha também impacta a altitude. Me vi pedalando por subidas que não imaginava ser capaz, mas também a mais de 3.000 metros, encarando frio, vento e chuva.

Logo o corpo se adapta e, mais importante, a mente também. E não muito tempo depois já aprendi a desfrutar as subidas, que estão acompanhadas de descidas, claro. Passei a desfrutar e preferir pedalar pelas montanhas. Hoje me parece menos monótono e geralmente são locais com paisagens de tirar o fôlego e com pessoas receptivas.

Pensava inicialmente em chegar à costa colombiana e então cruzar ao Panamá para seguir pela América Central. Pois bem, em uma casa de ciclistas onde descansei por uns dias, conheci outros cicloviajantes e, com dois deles (um argentino e um uruguaio), fizemos o trecho de Medellín (noroeste) a Bucaramanga (norte) juntos.

Essa já foi a primeira grande mudança de rota na viagem, porque vinha de Bogotá (centro) rumo à costa passando por Medellín. Como decidi acompanhá-los por esse trecho, acabei virando ao leste e cruzando as Cordilheiras dos Andes outra vez. Haja subida!

O colega uruguaio havia passado pela Venezuela vindo desde o Brasil, também de bicicleta. Eu tinha bastante curiosidade, e ele me contou sobre as experiências que teve. Me disse que, apesar de tudo, o lugar que mais havia gostado em toda sua viagem foi o país de Maduro. Como eu já havia chegado a Bucaramanga e a Venezuela já estava logo ali, deu aquela curiosidade…

Venezuela

Passei a entender a complexidade que seria entrar ao país ao chegar à cidade colombiana de Cúcuta, na fronteira. Fiquei uma noite descansando em um hotel onde trabalhava um ciclista que me recebeu sem cobrar nada.

Soube lá que, na Venezuela, não poderia sacar dinheiro e que não aceitavam cartão internacional por conta dos bloqueios. Restava levar dinheiro, mas em que moeda? Pouco gente tinha informação e só fui entender isso após um tempo viajando pelo país. Em cidades fronteiriças, estão utilizando pesos colombianos como moeda principal e também fazem transações em dólar.

Mas o interior do país está dolarizado. O bolívar, moeda local, está em desuso devido à hiperinflação. É necessário carregar quantidades absurdas de notas para se comprar coisas mais simples. O dólar também dá mais estabilidade, apesar de não ser à prova da louca inflação que presenciei.

No país vi cidades em que a situação está quase beirando à normalidade mas, na maioria, choca qualquer desavisado. Comércios fechados, supermercados vazios, cidades desertas. Acompanhei um anfitrião por 5 horas em uma fila para colocar gasolina. Há lugares em que duram dias.

Em Maracaibo, a família de ciclistas que me recebeu não tinha água em sua casa havia duas semanas. Vivi diversos apagões, sendo que um deles foi geral, impactou todo o país por 3 horas.

Me hospedei com uma família em Coro, ao norte, que morava em uma rua onde só vivia gente mais velha. Todos os jovens emigraram. No país simplesmente não há mais oportunidades. A grande parte está sobrevivendo, cuidando de suas casas e esperando que algo mude.

Esse é um lado do país, o outro são as pessoas. Que povo!

Havia tido experiências muito boas no Brasil e na Colômbia, mas a Venezuela superou tudo. Cruzei o país durante 2 meses gastando menos de 30 dólares, porque sempre era recebido por alguém, um contato de um amigo de um amigo de um outro amigo que havia feito no país, ou então pessoas que simplesmente me viam na rua e me convidavam para me hospedar com eles, me davam comida, frutas, água.

E essa foi a impressão que ficou.

A bicicleta é mágica

Escrevo de dentro da minha barraca na Cidade do Panamá, e completo 6 meses de jornada.

E para que você entenda um pouco como é a experiência, cheguei ao lugar sem contatos. Se nada acontecesse, iria aos bombeiros pedir um cantinho para colocar minha barraca e descansar.

Entrando na cidade, um carro passou me chamando. O motorista era um colombiano vivendo no Panamá há 15 anos, com a esposa. Viajante, me contou que já subiu muita montanha em vários países e disse que sabe como é uma pessoa sair sozinha carregando tudo que possui, o desafio que é chegar a um lugar sem conhecer ninguém, só trazendo boa intenção e sede de novos conhecimentos.

Após uma conversa, me convidou para pôr minha barraca em uma área livre na casa deles pelo tempo que quisesse. Ou seja, chegando a uma das cidades mais caras do trajeto, sem contato e nenhuma indicação, a estrada tratou de fornecer uma solução e aqui estou em minha barraca, com acesso à internet, banheiro, cozinha e máquina de lavar roupa. Quer mais conforto que isso?

Próximos planos

Não saí com um plano fixo, mas somente com um norte, de seguir subindo a América Central, sem um objetivo de destino ou tempo. Se fosse para trabalhar com metas e cronogramas, estaria em um escritório. Agora, por exemplo, pensei que já estaria na Nicarágua ou na Costa Rica, mas teve uma Venezuela no meio no caminho.

Sempre digo que a viagem pode terminar amanhã se eu acordar sem vontade de seguir. Ou pode durar alguns anos mais, caso tenha condições, saúde, e esteja desfrutando.

Então segue aí e vamos viver essa aventura juntos!

Para finalizar, deixo uma sugestão. Monte em uma bicicleta e se surpreenda com as distâncias que podem ser percorridas e com a sensação de liberdade. Comece explorando os arredores da sua cidade e quem sabe um dia você não seja um cicloviajante.

*

Aviso aos passageiros 1: Volto a sugerir o blog da jornalista Erika Sallum, o Ciclocosmo. Há muita informação sobre o mundo das bikes

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