Check-in https://checkin.blogfolha.uol.com.br Relatos de turistas, dicas e serviços de viagem Wed, 01 Dec 2021 12:49:26 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Casal divide o amor por viagem e percorre 72 mil km de carro com os filhos pela América do Sul https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/11/27/casal-divide-o-amor-por-viagem-e-percorre-72-mil-km-de-carro-com-os-filhos-pela-america-do-sul/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/11/27/casal-divide-o-amor-por-viagem-e-percorre-72-mil-km-de-carro-com-os-filhos-pela-america-do-sul/#respond Sat, 27 Nov 2021 18:35:39 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/11/163796575861a15fbe48d3a_1637965758_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=826 Viajar é muito bom. Melhor ainda quando se pode dividir o amor por cair na estrada com alguém. Raul, por exemplo, deu sorte de encontrar a Adriana, que nutre esse sentimento de desbravar o mundo.

Eles fizeram algumas viagens de carro juntos e seguiram assim quando os filhos vieram. Todo anos a família se organizava para ter alguns dias livres para dirigir por aí. O perfil deles no Instagram (@calugui_expedicoes), inclusive, é uma homenagem ao nome dos filhos: Caio, Lucca e Guilherme.

Nos últimos tempos eles viajaram por vários países da América do Sul e, como o bichinho da estrada sempre pica a gente, eles querem agora fazer uma expedição até o Alasca, percorrendo a América de motorhome.

Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Nossa história começa quando eu e a Dri tomamos a decisão de que colecionar momentos com o pé na estrada seria o nosso estilo de vida. Meu interesse pelo assunto nasceu na infância. Meus pais imigraram da Argentina logo que se casaram, então minha família sempre teve o costume de viajar longas distâncias de carro.

Em 1985 visitei o Salão do Automóvel com meus pais e irmãos e me lembro de ter ficado impressionado com a Kombi Safari Motorhome. Comentei com meu pai que aquele veículo seria ideal para as nossas viagens de fim de ano. Aquilo me marcou e eu pensei comigo: um dia ainda vou ter um motorhome e sair por esse mundão.

O tempo passou e eu conheci a Adriana na época em que trabalhava no negócio da família. Em 1999 eu a levei para conhecer meus parentes na Argentina e foi a primeira viagem de longa distância que ela fez (foram 20 dias e 7.500 km). Ali eu descobri que ela gostava de colocar o pé na estrada tanto quanto eu.

Casamos, os filhos chegaram, seguimos trabalhando nos nossos projetos e sempre que podíamos pegávamos o carro com a família toda e saíamos por aí (nos organizávamos para que pudéssemos estar na estrada de 15 a 30 dias por ano).

A partir de 2015 começamos a realizar nossas expedições para lugares mais distantes. Em março desse ano viajamos para a Patagônia argentina, num total de 25 dias e 8.500 km. No ano seguinte, fizemos uma expedição para a região de Mendoza, na Argentina, e a famosa travessia pela estrada Caracoles até o Chile via Cordilheira dos Andes.

Durante essa viagem tivemos a oportunidade de conhecer viajantes do mundo todo, em motorhome, motos e até bikes. Muitos deles perseguindo o desafio de chegar à cidade mais austral do continente, Ushuaia. Nem bem tínhamos concluído nossa expedição Mendoza-Chile, e já estávamos planejando o próximo destino: Ushuaia.

O ano de 2016 foi de muito planejamento e pesquisa para organizar a expedição que viria a seguir, atingir o ponto mais extremo do continente sul-americano, localizado em Tierra del Fuego. Em janeiro de 2017 viajamos os cinco: eu, a Dri e nossos três filhos adolescentes num veículo SUV comum.

Foram 32 dias e 15 mil km pelas Rutas 40 e 3, no território argentino, e a belíssima Carretera Austral, no Chile. Ao longo da nossa expedição, pudemos visitar lugares mágicos como Glaciar Perito Moreno, Capillas de Marmol, Torres del Paine, Punta Arenas, Punta Tombo, além de diversos parques situados nas Patagônias argentina e chilena.

Foi nessa viagem que a Dri resolveu aumentar a aposta e propôs um novo desafio. Ao final da Ruta 3, em Ushuaia, no Parque Nacional Tierra del Fuego, há uma placa com a inscrição da distância dali até o Alasca: 17.848 km. Se agora já havíamos conhecido os pinguins, estava na hora de ir em busca dos ursos!

Ainda em 2017 fizemos outra expedição, desta vez para realizar o sonho dos nossos filhos de conhecer a neve, e viajamos novamente para a Patagônia argentina, região de San Martín de los Andes, em julho. Fomos agraciados com a maior nevasca dos últimos 30 anos e computamos mais 8.000 km pra conta!

Nesses anos de Calugui Expedições (@calugui_expedicoes), já percorremos mais de 72 mil km e vivenciamos muitas aventuras, que nos proporcionaram momentos e recordações incríveis! Aliás, o nome Calugui é uma homenagem aos nossos três filhos: Caio, Lucca e Guilherme.

Nessa jornada, tivemos a oportunidade de conhecer os países do cone sul (Uruguai, Paraguai, Argentina e Chile) e também o Brasil, que tem sido o nosso destino neste momento de pandemia. Há muito o que conhecer do nosso país, rico em belezas e diversidade natural.

Prestigiar e desbravar esse imenso litoral com o qual fomos presenteados, e em especial o do Nordeste, é o projeto no qual estamos trabalhando agora e pelos próximos dois anos. A expedição está programada para início de 2022 e antecede o planejamento da maior de todas as expedições, a do Alasca.

Neste ano de 2021 conseguimos realizar o nosso sonho (aquele meu de infância, e compartilhado com a minha esposa) de ter o nosso motorhome do tipo Camper, mais uma etapa na direção do nosso grande objetivo. Em parceria com uma empresa do Paraná, adquirimos o nosso equipamento e o nosso veículo hoje está devidamente preparado para rodar longas distâncias com todo o suporte e apoio imprescindíveis à manutenção da nossa rotina e necessidades primárias de descanso, higiene e alimentação.

Toda essa mudança de vida foi, no entanto, impulsionada por problemas sérios de saúde que enfrentei e que me fizeram encarar a vida de outra forma. A Calugui Expedições nasceu desse novo olhar, do entendimento de que a vida está aí para ser vivida na sua plenitude, desse desejo de viajar e conhecer as maravilhas que o nosso planeta tem a nos oferecer, cuidando, zelando e respeitando-o como ele merece.

Saborear as experiências, colecionar momentos e perpetuar memórias, é disso que se trata! Há uma frase que eu gosto muito de Thomas Hardy que diz: “A felicidade não depende do que nos falta, mas do bom uso do que temos.”

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Aviso aos passageiros 1: A família Barros está viajando desde 2017 numa Kombi e tem como objetivo chegar ao Havaí. Por enquanto, estão aproveitando a Bahia

Aviso aos passageiros 2: Quem também caiu na estrada de carro é o casal Lucas e Maíra, que passou a viajar pelo país durante a pandemia

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Subir ao Auyantepui, na Venezuela, envolve dias de trekking e de rapel https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/06/16/subir-ao-auyantepui-na-venezuela-envolve-dias-de-trekking-e-de-rapel/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/06/16/subir-ao-auyantepui-na-venezuela-envolve-dias-de-trekking-e-de-rapel/#respond Wed, 16 Jun 2021 18:15:25 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/2º-Dia-de-Trekking-Face-sul-do-Auyantepui-1-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=752 Em meio a várias histórias de quem viaja de carro por aí, trago um relato de trekking de muitos dias para chegar ao Auyantepui, um dos muitos tepuis –formação ao estilo mesa– da Venezuela.

Quem nos conta a experiência é a leitora Beatriz Pianalto de Azevedo, que já escreveu ao blog sobre suas viagens a Guiné-Bissau e ao Butão. A última história dela, inclusive, também envolveu uma longa expedição, mas ao ponto mais alto do Brasil, o Pico da Neblina.

Em tempos de coronavírus nossas viagens ficaram mais restritas. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Início da expedição

A Venezuela detém a maioria dos tepuis do planeta: 115, sendo que a maioria se localiza no Parque Nacional Canaima, destacando-se o Auyantepui, Kukenan e Roraima. O restante dos 140 estão distribuídos pela África, Austrália, Colômbia, Uruguai, e, no Brasil, os mais belos exemplares estão no Jalapão (TO), Chapada das Mesas (MA) e Livramento (RS). 

Decidida a enfrentar o Auyantepui (o Roraima conhecera em 2011), contrato uma agência venezuelana e me mando no feriado de Carnaval de 2016 para Caracas, onde conheço os demais membros da expedição, oito europeus. De Caracas voamos a Puerto Ordaz e dia seguinte vamos de busão a Ciudad Bolivar, onde nos esperam três avionetas do tempo de Saint-Exupéry. 

Uma das avionetas que levaram o grupo de Ciudad Bolívar à aldeia pemone Uruyen (Arquivo pessoal)

Aqui já começa a aventura na balouçante aeronave. Após 50 minutos de voo, a vegetação rasteira de savana cede lugar à espessa vegetação da floresta amazônica. De repente, na paisagem plana, os tepuis começam a aflorar, espocando tal qual pipoca no solo. Majestoso é pouco para descrever a belezura desse tipo de elevação, em forma de mesa, com paredes verticais, cuja altura varia de 2 mil a 2.900 metros. 

A avioneta nos deixa em Uruyen, uma das tantas aldeias indígenas pemones, existentes no parque, onde pernoitamos. A paisagem que se desfruta de qualquer lugar donde se esteja é a da magnífica face sudeste do Auyantepui e de suas encostas revestidas de vegetação. 

Com altas muralhas formando recortes variados, sua superfície alcança 700 km², motivo por que é de longe o maior de todos os tepuis existente no planeta. A expedição conta, além dos três guias, com 18 pemones que transportam, nas costas, em cestas de vime bagagens e equipamentos. 

1º dia de trekking

Deixamos a aldeia Uruyen e após curta pernada saímos da savana, iniciando a ascensão do Auyan. Circundando a sua face sul, há três extensos platôs rochosos, formando como que gigantescos degraus que antecedem o topo. 

Hoje subiremos até a 1ª plataforma. Percorremos uma mata relativamente cerrada e desembocamos no espaço aberto do cobiçado platô, após ardida subida. A recompensa é a encantadora visão de pedras cobertas por musgos e líquens, arbustos, flores, sombra e água fresca. 

Almoçamos no alto da plataforma tendo aos nossos pés o vale Kamarata. O caminho então se torna moleza: suave descida sucedida por trecho plano até o acampamento Guayaraca (1.011 m). Com a escuridão já quase instalada, tem início o show de luzes dos pirilampos.

2º dia de trekking

A trilha plana alterna trechos de savanas e bosques. Dissipada a cerração, o sol brilha no céu. Mimetizada entre raízes e folhas, uma enorme cascavel, toda enrodilhada, de sentinela no meio da trilha. Dum riacho recolhemos água para enfrentar a subida até o topo da 2ª plataforma, quase uma escalaminhada, donde se tem uma visão estupenda da avermelhada face sul do Auyantepui.  

A ascensão, no meio da estreita picada, aberta na floresta, é inclinada para caramba. O guinchar dos macacos é perfeitamente audível, assemelhando-se, pasmem, a rajadas de vento. A subida continua pois temos de alcançar a metade da 3ª plataforma onde acamparemos. 

Vencidas outras tantas escalaminhadas, feitas com cuidado, porque há largas fendas entre as pedras, chegamos enfim ao acampamento El Peñon (1.870 m). No final da tarde, o sol ao se pôr colore de dourado a parede do tepui. Após a janta, maior silêncio no acampamento, apenas o movimento dos pirilampos inundando a mata de inúmeros pontos luminosos. 

3º dia de trekking

Hoje é dia de alcançarmos o topo do Auyan. A base da parede sul do tepui é pedra sobre pedra cercada de mata por todos os lados, daí por que a caminhada é pura escalaminhada. Em retrospecto, a subida ao topo do Roraima foi moleza! A neblina dá uma pausa e permite que se avistem os gigantescos totens de pedra que guardam a trilha. 

A partir do paredão, sete ascensos exigem cordas até o topo. Um mundo de indescritível beleza atravessa blocos gigantescos de rocha entremeados por exuberante vegetação. Quando a névoa se dissipa um pouco, se avistam espaços vazios entre os blocos de arenito. Num desses, apelidado de Callejón de las Palomas, se escuta o arrulhar de centenas de pombas que fazem do buracão seu ninho. 

A fatigante subida entre as colossais torres acaba de repente. Já estamos no topo, avisa Fred, o líder dos guias. Refeita da emoção, percebo duas muralhas dispostas perpendicularmente uma à outra.  A que importa é a 2ª, que dá acesso ao ponto donde desceremos, rapelando, um paredão de 1 mil metros. 

Um mundo totalmente inédito o topo do tepui. Ao contrário do Roraima, surpreende pela quantidade de bosques e pela coloração mais clara dos maciços rochosos. Almoçamos à beira do rio Naranja e ao chegarmos ao acampamento El Oso (2.165 m), no meio da tarde, o céu está desanuviado. 

À noite, quando as caprichosas nuvens permitem, se vêem zilhões de estrelas no firmamento. 

4º dia de trekking

Nosso próximo destino é o acampamento Dragon. Inicialmente caminhamos por uma superfície rochosa plana. Apenas dois trepa-pedras envolvem certas habilidades para transpô-los. 

O céu ora ensolarado ora nublado. Entramos numa mata fechada, cheia de sinuosas curvas, um sobe e desce ininterrupto conhecida como labirinto. A floresta é linda com arbustos e árvores hospedando em seus troncos variedades de bromélias. 

De repente, numa dobra da mata, uma visão extasiante: cercado por margens cuja areia é rosada, as douradas águas do rio Churun, onde nos banhamos. A poucas centenas de metros o maciço paredão da 2ª muralha. 

Chegamos ao acampamento Dragon (1.765 m), no meio da tarde. Da minha barraca, escuto o conversê dos guias mas nem eles tampouco os pemones fazem frente à tagarelice dos belgas, imbatíveis na charla! 

5º dia de trekking

Como de costume, o dia amanhece nublado. Escuto a 20 metros da barraca o barulhinho gostoso da correnteza do Churun. A passarada assanhada não para de trinar. Deve estar, no mínimo, curiosa com nossa movimentação, afinal Auyantepui não é point turístico bombado como o Roraima. 

A escalaminhada em paredão exposto até o topo da 2ª muralha mostra-se bem ríspida. Mas a beleza do mundo encantado das pedras e dos musgos suplanta qualquer cansaço. 

Quando terminamos a subida e alcançamos o topo da 2ª muralha, as dificuldades não param. Tudo porque temos pela frente quilômetros de terreno fofo coberto de areia e material orgânico, seguindo-se um solo pantanoso quando entramos em úmidos bosques. 

Após hora e meia de pernada, aleluia, chegamos a uma baixada onde se encontra o acampamento Neblina (1.820 m). 

6º dia de trekking

Eeebaaa, hoje as subidas nem são lá muito puxadas. O espesso matagal de samambaias acaba num terreno coberto por lajes, livre de vegetação. Após breve descanso, a pegada é encarar o interior dum bosque escuro, atravancado de troncos e galhos de árvores caídos no chão desnivelado que alterna baixadas e subidas. 

Tudo muito úmido, tornando o solo em certos trechos uma meleca pantanosa. No início da tarde, já estamos no acampamento Kerepa, fincado à margem do rio de mesmo nome.  Por causa do mau tempo, fico na barraca lendo. 

7º dia de trekking

Embora o trajeto seja curto, dura é a distância até o acampamento Salto Angel neste último dia de caminhada. Semelhante a de ontem, a trilha se dá no mesmo tipo de bosque cerrado, escuro e úmido, com subidas e descidas lamacentas. 

Louquíssimo o trecho de selva onde espessos musgos de coloração ferruginosa recobrem troncos e galhos de árvores. De repente, nos livramos do matagal e entramos num campo coberto de gramíneas, vencendo sem esforço uma curta ladeira, após o que alcançamos, enfim, o acampamento Salto Angel, montado também à margem do rio Kerepa. 

À tardinha, nos acomodamos ao redor da fogueira, providencialmente acesa pelos porteadores, pois um arzinho gelado paira no topo do tepui. À noite, reina o maior silêncio no acampamento, já que amanhã levantamos às 4 horas para enfrentar o restante da aventura. 

Os dois dias de rapeis 

A partir de hoje, nossa pernada será diferente: enfrentaremos dois dias de rapeis numa parede de quase mil metros, pouco distante do Santo Angel, terminando a aventura no rio Churun. 

Nos seis primeiros rapeis a descida se dá em parede quase desnuda de vegetação. Já os 7º e o 8º rapeis são feitos em meio a arbustos. Para chegar ao ponto do 6º rapel, somos becapeados a improvisado corrimão de cordas antes de percorrermos os 20 metros do estreito platô, limitado à esquerda pelo despenhadeiro de 700 metros de altura. 

Embora este rapel seja o pior de todos, com 90 metros de exaustiva descida, sou recompensada quando, num lance negativo, a corda me faz girar 180º, permitindo que eu dê as costas à parede e veja aos meus pés o cenário sensacional do canyon del Diablo cortado pelo rio Churun. 

Quase no final da tarde, chego ao acampamento Cueva, um largo platô encimado por um baita teto de rocha onde bivaqueamos. Deitada, aprecio o sol iluminar a parede leste do tepui, acentuando a coloração rósea de sua rocha. 

Um dos vários momentos de rapel na expedição (Arquivo pessoal)

Após a emocionante descida de 475 metros, eis diante de meus olhos, a poucos metros, o Salto Angel! 

Faltando ainda 500 metros de baixada, dia seguinte, realizamos outros sete rapeis, todos em meio ao matagal. Cada vez mais perto do leito do rio Churun, já escuto seu rumorejar. 

Não tinha ideia de que a aparente verticalidade da parede -vista de fora- particularmente nestes 500 metros finais, comportasse tantas plataformas, algumas com capacidade de acomodar 20 e tantos viventes, bem como trechos onde se pode caminhar sem necessidade de rapel. 

Terminados os rapeis, uma caminhada numa baixada hiper íngreme e resvaladiça até o mirador do Salto Angel. Chegamos à tardinha a Isla Ratón onde pernoitamos num dos muitos refúgios ali existentes. 

Construída à margem esquerda do rio Churun, na rústica habitação, uma dezena de redes serve como cama. Após a janta, deitada na rede e embalada pelo toin toin toin das gotas de chuva tamborilando no teto de zinco, penso cá com os meus botões: terminou o que era doce, quem desceu o Salto Angel se arregalou!

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Aviso aos passageiros 1: Se você gosta de aventura e altura, pode se interessar pelo relato do alpinista e escritor Thomaz Brandolin, que contou como foi escalar o Monte McKinley ou Denali, o ponto mais alto da América do Norte

Aviso aos passageiros 2: O Check-in também tem o relato do escritor Marcelo Lemos, que subiu ao topo do Kilimanjaro, o ponto mais alto da África

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Brasileiro conta como foi escalar o ponto mais alto da América do Norte https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/03/23/brasileiro-conta-como-foi-escalar-o-ponto-mais-alto-da-america-do-norte/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/03/23/brasileiro-conta-como-foi-escalar-o-ponto-mais-alto-da-america-do-norte/#respond Tue, 23 Mar 2021 17:42:56 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/1616462343605942073229a_1616462343_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=678 O Check-in já publicou o relato de quando Marcelo Lemos subiu ao topo do Kilimanjaro, o ponto mais alto da África. Desta vez, você pode saber como é escalar o Monte McKinley ou Denali, o mais alto da América do Norte.

Quem nos conta sobre a empreitada é o alpinista e escritor Thomaz Brandolin. Autor de várias obras, ele está lançando o livro “Um Outro Mundo lá Fora – Expedições ao Ártico, Antártica, Alasca e Himalaia”, que reúne histórias de viagem feitas de 1986 a 2012.

Foi em junho de 1986 que o paulistano atingiu os 6.194 metros do Monte McKinley ou Denali, no Alasca. Pelo relato, extraído do novo livro, é possível ver quão perigoso é um projeto como esse.

Em tempos de coronavírus nossas viagens ficaram mais restritas. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Parte 1 – Monte McKinley/Alasca (Monte Denali para os locais)
4º dia – quinta-feira, 19 de junho – Cume – 6.194 metros

Acordamos cedo. Lentamente e em silêncio arrumamos nossas mochilas. Embora confiantes, pairava uma tensão no ar. Ventava forte e o ar glacial do lado de fora da barraca era paralisante. Esperamos até quase meio-dia, quando o vento deu uma diminuída, para nos conectarmos à corda. Era um ritual quase diário. A partir dali e até o final do dia nossas vidas estariam conectadas àquela corda. Demos um emocionado abraço um no outro e saímos para o ataque ao cume! Havia sol e céu azul, mas as rajadas de vento arrancavam a neve da superfície e jogavam na nossa direção. Naquele frio, realmente era um aborrecimento escalar com neve sendo jogada contra o rosto. Ofegante devido ao ar rarefeito, sentia o vento áspero e gelado rasgar minha garganta, me gerando um acesso de tosse.

Saindo do acampamento, lentamente alcançamos a base da longa aresta que nos levaria ao nosso destino: o cume da montanha, ainda invisível e a muitas horas dali.

Conforme fomos ganhando altitude, o vento foi aumentando de intensidade, criando uma suave cortina de cristais de gelo suspensos no ar. A força do vento produzia um ruído que sufocava qualquer vestígio do silêncio típico daquelas paragens. O termômetro registrava 28 graus abaixo de zero, mas a sensação térmica era muito inferior a isso. Uma situação que poderia congelar qualquer parte exposta do corpo em questão de minutos.

Durante praticamente três horas subimos em silêncio, lenta e calmamente, cravando as pontas dos crampons e da piqueta na neve crocante. A paisagem em volta de nós era espetacular, com montanhas a perder de vista. Com os óculos especiais para neve, o céu ganhava um azul ainda mais intenso, bonito de se ver. Eu parava a cada quatro ou cinco passos para respirar aquele ar rarefeito, que machucava meus pulmões. Sempre ofegantes e incomodados com o barulho e a força do vento, a comunicação entre nós limitava-se a esporádicas trocas de sinais.

Subindo na frente, de cabeça baixa, eu esquadrinhava cada centímetro daquela rampa gelada. Era preciso ser cuidadoso ao dar cada passo, pois o vento às vezes me desequilibrava. Mas nada disso nos abalava. Lutando para prosseguir, mergulhei em meus pensamentos e me concentrei apenas no passo seguinte.

Estávamos numa rampa pouco inclinada –30°– que levava direto ao Denali Pass, mas muito batida pelo vento. A neve, ali, estava dura como um concreto, e qualquer escorregão, se não fosse travado na hora, podia levar o alpinista de volta ao glaciar, dois quilômetros abaixo! Aliás, foi provavelmente ali que morreu o japonês Naomi Uemura, dois anos antes, quando voltava do cume.

De repente vi dois homens descendo na minha direção. Vinham quase que correndo e pareciam assustados. Quando o primeiro me alcançou, gritou algo sobre o vento e continuou descendo. O segundo fez a mesma coisa. Só pude entender que o vento lá em cima estava um inferno, impossível subir, e que eles haviam desistido de prosseguir. Com o barulho ensurdecedor do vento rugindo em minhas orelhas, não dava mesmo para conversarmos.

Mais abaixo, éramos seguidos por cinco alpinistas. Mas, assim que os dois apressados escaladores passaram por eles, quatro viraram as costas e começaram a descer também. Só um insistiu.

O Beto e eu olhamos um para o outro em busca de uma resposta. O que fazer? Vamos continuar ou vamos voltar? Com uma tempestade prevista para o dia seguinte, voltar era quase que encerrar a expedição. Havia meses que estávamos envolvidos naquele projeto. De corpo e alma. Treinando, planejando, sonhando. Desistir logo agora? Depois que arriscamos nossas vidas para buscar mais comida?

Desistir depois de 13 dias subindo pela geleira, puxando um pesado trenó atrás de nós, contornando fendas, suportando frio, vento e ar rarefeito? Por outro lado, será que já não havíamos arriscado o suficiente nossas vidas para alcançar aquele sonho?

Quantos não passaram por sofrimentos ou morreram por não saberem a hora de desistir?

Minha cabeça ficava imaginando coisas, analisando alternativas e riscos. Mas o raciocínio, carente de oxigênio, se misturava à adrenalina e a sentimentos de medo e raiva, uma raiva que me impulsionava para cima, positiva e perigosa, como se dissesse: “Pode vir, vento, você não vai me fazer desistir!”.

Estávamos agora a uns 5.700 metros de altitude. Quem sabe, talvez, aquela fosse nossa única chance? Tínhamos bastante comida no Campo 7, mas teríamos força física e psicológica, além de condições climáticas para mais uma tentativa?

Entorpecido pelo frio e pela falta de oxigênio, tentava refletir sobre os prós e contras de continuar. O coração batia forte, a boca estava seca, e precisávamos tomar uma decisão. E rápido. Esperei o Beto chegar até mim para decidir o que fazer.

O fato de estarmos bem equipados e com roupas adequadas ajudava, então, em poucas palavras, decidimos insistir mais um pouco!

O vento não dava moleza e só aumentava sua fúria. A ventania era tão forte que nos obrigava a escalar encurvados e só dava para sentar para descansar quando havia alguma pedra grande para nos proteger. A cada parada, o alpinista que seguiu solitário mais abaixo se aproximava de nós. Porém, quando ele parava para descansar, nós já estávamos prontos para prosseguir. Nossos movimentos eram tão lentos que o mundo parecia avançar em câmera lenta. Mas seguimos para cima. Iríamos até o limite de nossas forças.

Numa dessas paradas, o americano pediu que o esperássemos. Ele nos perguntou se era possível esperá-lo mais acima, perto do cume, para se conectar à nossa corda para vencer a última aresta, muito exposta e perigosa, principalmente naquele vento. Claro que sim, respondemos.

Finalmente, quando atingimos o Denali Pass, viramos para o lado sul da montanha, e o vento, enfim, amainou, como se tivesse desistido perante nossa teimosia.

Quando avançamos por um imenso platô a 5.980 metros de altitude, conhecido como Campo de Futebol, avistamos o cume pela primeira vez. Ao vê-lo ali na frente, tão perto da realização de um sonho, não pude evitar as lágrimas. O Beto também chorava de emoção. A pressão psicológica dos últimos dias nos tornara mais emotivos. Ao pressentir que iríamos chegar lá, tiramos um caminhão das costas.

Aos poucos escalamos mais uma rampa nevada de 120 metros e, exaustos, paramos para esperar pelo americano. Chegando à beirada do abismo, avistamos, surpresos, uns três quilômetros abaixo, um mar de nuvens cobrindo toda a gigantesca geleira que havíamos percorrido nas duas semanas anteriores. Apenas alguns picos conseguiam se sobressair. Ali tivemos a real dimensão da nossa jornada. Cumes e platôs que vimos de baixo, agora estavam aos nossos pés. Era uma visão espacial inimaginável, de rara beleza, que só estava ao alcance dos mais persistentes.

Quando o alpinista chegou e descansou, o Beto passou para o meio da corda e ele se encordou no final.

Ao ver o quanto a última aresta era afiada e perigosa, com abismos infinitos de ambos os lados, entendi a preocupação do americano. Qualquer passo em falso, e seria o fim.

Recuperamos o fôlego, respiramos fundo e, cuidadosamente, pé ante pé, prosseguimos. Com o coração quase saindo pela boca de emoção, parando para descansar a cada dois passos, em poucos minutos subimos a última rampa de neve e alcançamos o ponto mais alto da América do Norte. O Beto e eu nos abraçamos emocionados. Amigos de tantos anos, nós tínhamos conseguido! Foi um momento sublime. Eram 19h30, o céu ainda claro, com muitas nuvens. Olhávamos em todas as direções do infinito, absorvendo o encanto e a magia transcendentes de cada detalhe daquela imensidão. Raios de sol rasgando algumas nuvens davam um toque surreal ao cenário. Se a felicidade são aqueles momentos que você não quer que acabem, então o que sentíamos era a felicidade mágica e absoluta.

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Aviso aos passageiros 1: O casal de jornalistas João Paulo Mileski e Carina Furlanetto viajou pelo Brasil e por países aqui da América do Sul a bordo de um carro 1.0. Eles, inclusive, acabaram de lançar um livro sobre a empreitada, o “Crônicas na bagagem: 421 dias na estrada – uma jornada de desprendimento pela América do Sul”

Aviso aos passageiros 2: O jornalista e caubói Filipe Masetti lançou recentemente a obra “Cavaleiro das Américas rumo ao Fim do Mundo”, sobre quando percorreu, a cavalo, o trajeto Brasil-Argentina. No Check-in, é possível ler o trecho sobre a temporada de incêndios que enfrentou na Argentina, em janeiro de 2017

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Brasileiro que viajou a América a cavalo relembra incêndios na Argentina https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/01/13/brasileiro-que-viajou-a-america-a-cavalo-relembra-incendios-na-argentina/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/01/13/brasileiro-que-viajou-a-america-a-cavalo-relembra-incendios-na-argentina/#respond Wed, 13 Jan 2021 16:06:00 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/01/Filipe-1-300x215.jpeg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=620 Muita gente tem no currículo alguma viagem de avião, carro ou ônibus. Menos pessoas podem dizer que já rodaram por aí de moto ou bicicleta. Mas são poucos os que têm a experiência de viajar a cavalo.

A primeira grande viagem do jornalista e caubói Filipe Masetti foi de Calgary, no Canadá, a Barretos, no interior paulista, quando percorreu 16 mil km. O segundo trecho foi de Barretos a Ushuaia, na Argentina, e foram 7.500 km. Na sequência, ele cavalgou 3.500 km de Fairbanks, no Alasca, a Calgary.

Ao todo, Masetti viajou mais de 25 mil km por 12 países e chegou a escrever dois livros sobre suas expedições: “Cavaleiro das Américas”, sobre a sua primeira viagem, e o recém-lançado “Cavaleiro das Américas rumo ao Fim do Mundo”, sobre o trajeto Brasil-Argentina.

Abaixo, um trecho do livro sobre a temporada de incêndios que o brasileiro enfrentou na Argentina, em janeiro de 2017.

Em tempos de coronavírus nossas viagens ficaram mais restritas. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Depois de descansar por duas horas, selei os garotos de novo e continuei rumo a Médanos, a apenas dez quilômetros ao oeste. Minha anfitriã havia me alertado dos terríveis incêndios a frente.

A fumaça enchia o ar e o céu brilhava com um laranja estranho. Sabia que os incêndios florestais estavam queimando a província de La Pampa desde o Natal, mas não sabia que haviam chegado à província de Buenos Aires.

Quando cheguei a Médanos, era como se tivesse entrado em um filme apocalíptico. Respirar virou uma batalha com a fumaça cinza me sufocando e os cavalos também. O céu parecia estar em chamas.

“A essa altura, não sabemos se você conseguirá cavalgar amanhã, filho”, um gaúcho grande, amigo do Luis de Bahía me falou. “A rodovia está fechada por causa do incêndio que queima nos dois lados.”

Quando tirava as selas dos garotos, sirenes berravam, convocando todos os bombeiros voluntários para o quartel dos bombeiros. As sirenes eram altas e agudas, como aquelas usadas para alertar moradores das ilhas de um possível tsunami.

Meu coração pulou para a garganta. Estava preocupado com minha vida e a dos cavalos. Tomei a decisão errada ao cavalgar a oeste, para Bariloche?

Um jornalista, que veio tirar fotos nossas, contou aos gaúchos que me receberam que “duas mulheres foram queimadas vivas dentro do carro uma hora atrás.

Elas tentaram dar meia volta na rodovia porque não conseguiam ver nada com a fumaça densa. Um caminhão as atingiu quando faziam o retorno e as jogou dentro do fogo”.

Olhamos o céu ameaçador em silêncio, com tristeza e medo. Naquela noite, meu anfitrião, um cavaleiro de 70 e poucos anos, com cabelo grisalho espetado como um porco espinho, ofereceu-me um churrasco e umas garrafas de vinho.

Naquela região da Argentina, o vinho tinto é bebido com algumas pedras de gelo e água tônica. Achei estranho no começo. Porém, depois de beber a mistura várias vezes aprendi a apreciá-la, sobretudo nos dias de calor escorchante na sela.

Na manhã seguinte acordamos cedo e meu anfitrião me levou até os cavalos. “Liguei para o meu amigo, chefe de polícia”, disse o senhor. “Ele me avisou que o fogo queimou tudo adiante. Não há mais nada para ser queimado, então você pode cavalgar em segurança.” Não tinha certeza se essa notícia era boa ou má.

Saí de Médanos cavalgando com a fumaça densa empesteando o ar e os meus pulmões enquanto o vento soprava cinzas por todo lado. O chefe de polícia estava certo, o fogo havia queimado todo terreno adiante e não havia nada mais para pegar fogo.

Mas o sofrimento e a desolação eram imensos, era um cenário do apocalipse. Carcaças carbonizadas de vacas, pumas e tatus por todo lado. O cheiro podre, azedo, nauseabundo me forçou a prender a respiração para não vomitar.

As expressões paralisadas de sofrimento do gado partiram meu coração. Línguas para fora, bocas abertas, olhos arregalados. Muitas vacas tentaram fugir e ficaram presas. Estavam queimadas, emaranhadas na cerca.

As autoridades estimam que mais de 80.000 cabeças de gado foram mortas e mais de dois milhões de hectares de terra, queimados. Cavalos, cachorros e casas também foram perdidos nos incêndios causados por tempestades de raios e espalhados pela seca dos últimos anos e ventos fortes.

“Tentei soltar meus cavalos a tempo, mas quando cheguei à cabanha era tarde demais”, um gaúcho me contou. Uma lágrima solitária deixou uma marca ao descer por seu rosto empoeirado.

Por 170 quilômetros, a fumaça bloqueava o céu, o sol se infiltrava por ela, um laranja profundo sobre nós. Os cavalos e eu lutávamos para respirar enquanto os ventos fortes sopravam fumaça e cinzas em nossas caras o dia inteiro. Meus olhos ardiam e o fundo da minha garganta queimava.

Nos dois lados da estrada onde antes havia um tapete de pasto alto verde, amarela e marrom, agora havia troncos negro e uma camada de cinzas. Parecia que o mundo havia partido Cavaleiro das Américas rumo ao Fim do Mundo 181 sua cor. Seu brilho. Tudo ao meu redor era preto e cinza.

Na noite anterior à nossa chegada a Río Colorado, eu tinha apenas uma garrafa de 500 ml de água. Achei um curral aberto onde armei minha barraca, soltei Sapo e Picasso e bebi minha água devagar. Com lábios ressecados e a garganta seca, queria virar a garrafa, mas sabia que iria precisar dela no dia seguinte.
Sentindo-me totalmente vulnerável e mais sujo que um limpador de chaminé, vi uma velha caminhonete se aproximar e estacionar na frente da porteira. Um homem alto com a cara fechada saiu dela.

“Quem deixou você entrar?”, perguntou ao se aproximar. “Ninguém, senhor”, respondi. “Vi que a porteira não estava trancada e entrei.” Enquanto contava a ele sobre a minha viagem, ele me olhava de cima a baixo em silêncio. “OK, acho que você pode passar a noite aqui, mas se o dono aparecer, diga a ele que falou comigo.”

Aliviado, a tensão em meus ombros relaxou. Perguntei se poderia beber água do moinho próximo. Ele disse que não por causa do nível de sulfato. Apertamos as mãos e ele foi até sua caminhonete enquanto eu segui para minha barraca com a cabeça baixa. Olhava para o solo pedregoso quando ouvi um grito.

Quando olhei para cima, o homem que dois minutos antes eu achei que me devoraria vivo segurava uma garrafa de um litro de água congelada em sua mão. Corri, peguei a garrafa e agradeci a ele. Mais tarde, sozinho, sentado em minha barraca vendo os cavalos pastar, chorei em silêncio, segurando aquela garrafa gelada junto a minha bochecha esquerda.

O plástico gelado foi um alívio momentâneo para minha pele queimada. Era apenas água. Parecia ridículo alguém chorar sobre um litro de água congelada, mas estava muito desesperado momentos antes.

Quando se está com sede, quando sofre seus efeitos, aprende-se que a água é o recurso mais importante do planeta. Água é vida.

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Aviso aos passageiros 1: Na Argentina, rota dos Sete Lagos leva a San Martín e Junín de Los Andes

Aviso aos passageiros 2:O fotógrafo Sidney Dupeyrat já contou ao Check-in como foi sua viagem ao Chile, cheio de paisagens deslumbrantes

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Leitor relembra a noite em que dormiu no Hotel Califórnia https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/08/18/leitor-relembra-a-noite-em-que-dormiu-no-hotel-california/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/08/18/leitor-relembra-a-noite-em-que-dormiu-no-hotel-california/#respond Tue, 18 Aug 2020 17:57:28 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/15974350955f36ecd78195a_1597435095_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=460 Você lembra quando era comum pessoas irem a grandes aglomerações, como shows e eventos esportivos? Parece que faz décadas isso, não?

O jornalista Lima Medeiros nos traz um relato bem-humorado sobre a vez em que foi a um show do Eagles enquanto visitava sua filha em Portland, nos Estados Unidos.

Em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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A banda norte-americana Eagles, criada por jovens cabeludos do sul da Califórnia no início da década de 70, levou pouco mais de cinco anos para lançar seu terceiro disco, chamado “Hotel Califórnia”, cuja música-título catapultou o grupo para a primeira posição na parada da Billboard, mais precisamente em 7 de maio de 1977.

Embora aquela espécie de fusão entre country e folk não fosse minha vertente predileta do rock, seus riffs e acordes logo colaram nos ouvidos do pré-adolescente de 13 anos que habitava em mim e amava os Beatles e os Rolling Stones.

Muito tempo se passou desde aquela época até que, em agosto de 2014, já no figurino de um legítimo cinquentão, vivia os últimos dias de férias em Portland, em Oregon, na costa oeste dos Estados Unidos —para onde havia me deslocado em visita a Mariana, filha que fazia intercâmbio na universidade local—, quando descobri que a banda faria um show naquela noite, no Rose Quarter-Moda Arena, ginásio poliesportivo com capacidade para 20 mil pessoas, utilizado também para sediar os jogos de basquete do Portland Trail Blazers na NBA.

Sem conseguir arregimentar companhia para a expedição dinossáurica, parti no final de tarde para o local do show, já com ingresso e um bilhete do metrô de superfície no bolso. Cheguei com a antecedência necessária para um turista se achar em território estranho e, já no interior do Rose Quarter, me surpreendi com a estrutura que encontrei.

Um círculo de atrações gastronômicas e etílicas rodeava a área do espetáculo. Lógico que a segunda opção me atraiu mais. Porém, inadvertidamente em sentido anti-horário —acho que esse foi o problema— passei a me distrair com a degustação de boa parte das 37 draft beers disponíveis na área.

A empolgação foi tanta que não precisa ser vidente para prever o futuro da noite. Atrapalhei uns tantos até alcançar meu assento, incomodei outros para descobrir a ordem da set list —que teimava em não chegar sequer ao lobby do hotel tão desejado— até que do meio ao fim do programa meu ronco já se misturava ao som das guitarras de velhos cabeludos do sul da Califórnia.

Como num sonho, lembro vagamente da melodia daquela noite. “Welcome to the Hotel California. Such a lovely place (such a lovely place)”. De concreto, mesmo, só a mão no meu ombro e o recado do gringo: “Hey, man, you slept and lost Hotel California. The show is over. Now go home, okay !?”. De qualquer forma, poucos da minha geração conseguiram dormir uma noite no Hotel Califórnia.

Diálogo de surdos

Segui ao pé da letra a recomendação do “buddy” da arquibancada em voltar para casa na sequência. Apanhei o primeiro metrô que passou na frente do estádio e fiquei contente em vê-lo atravessar a Steel Bridge, pois havia passado por ali horas antes e isso indicava acerto na escolha do rumo.

A alegria durou pouco. Vencida a ponte, o motorneiro virou para a direita e a composição ganhou velocidade. Meu caminho, à esquerda, cada vez mais distante. Imaginei um balão, um atalho ou algo do gênero para me acalmar, mas isso só me afastava cada vez mais do destino.

Stop. Parei, saltei, atravessei a avenida e aguardei pelo próximo metrô no sentido inverso. Isso (quase) sempre deu certo, raciocinei. Um simpático desconhecido —sempre existe um— que me viu por ali tratou de avisar que, pelo horário, não havia mais condução naquela noite. Passava da meia-noite, é verdade.

Meu inglês macarrônico agora teria que entrar em ação, pois seria necessário arrumar um táxi e explicar ao motorista para onde precisaria ser levado. Minha filha já imaginava essa situação quando precavida colocou um papel em minha jaqueta com o endereço do seu apartamento, nas imediações da Portland State University.

Após uns 15 minutos de espera, finalmente consegui parar um táxi. Entrei e de cara achei que meu futuro estava garantido. O motorista, de turbante e barbas longas, mais parecia um consultor de tarô. Indiano, logo disse que sabia menos inglês do que eu e fazia uma semana que aceitara fazer um extra como taxista na cidade a que chegara não fazia dois meses. Pelo menos foi isso que entendi.

O papel que lhe passei com o endereço não fez muito sucesso, notei, quando passamos pela terceira vez na frente de uma mesma cervejaria, na Flanders Street. Infelizmente estava fechada. Interpretei como um sinal.

Nessa altura, o diálogo que se reproduzia no carro era cômico, não fosse trágico. Uma minitorre de babel ou, para ser mais contemporâneo, um petit comité da assembleia geral da ONU. Desculpem os inevitáveis clichês. Português, inglês, híndi e bengali, em qualquer de suas 400 variantes, das quais nenhuma delas entendo. Porém, nervos no lugar, a supremacia da ciência sobre o empirismo revelou-se salvadora.

Pedi o papel com o endereço ao nosso chofer da rodada, Manoj —segundo seu crachá de identificação—, e reparei que não havia referência explícita a universidade, mas sim ao nome da avenida onde se localizava o edifício.

“University, please! Portland State University! P-S-U!”. Ele captou a mensagem, finalmente, não sem antes dizer algo como “por que não falou antes…?”. Tirou onda na madrugada fria de Portland. Após um autêntico city tour, fui deixado no portão frontal da universidade, quase 1h30 da manhã.

Como não tinha rúpias, fui obrigado a deixar um punhado de sofridos dólares nas mãos de Manoj que, se me testou a paciência, trouxe-me para casa sem arranhões. Tempos depois, ao relatar esta história para um amigo de origem asiática, já no Brasil, este gargalhou ao me explicar que o nome do taxista, a partir do sânscrito e baseado na mitologia indiana, significa “aquele que compreende os outros”.

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Aviso aos passageiros 1: O blog Lineup, da Folha, cobre grandes shows e festivais de música no Brasil e no mundo. Mesmo durante a pandemia, há shows rolando na internet

Aviso aos passageiros 2: O Virgin Money Unity Arena, um festival no Reino Unido, reuniu o público em cercados para cumprir distanciamento. Será esse o novo normal?

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Mochileiro perdido guia ‘Na Selva’, versão anos 1980 de ‘Na Natureza Selvagem’ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/08/11/mochileiro-perdido-guia-na-selva-versao-anos-1980-de-na-natureza-selvagem/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/08/11/mochileiro-perdido-guia-na-selva-versao-anos-1980-de-na-natureza-selvagem/#respond Tue, 11 Aug 2020 18:17:06 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/15971084755f31f0fb75c92_1597108475_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=447 Mochileiros têm por hábito se aventurar, desbravar novos destinos e fugir das atrações apinhadas de turistas tradicionais. É isso que motiva o protagonista de “Na Selva”, vivido por Daniel Radcliffe, disponível no TelecinePlay.

O ator, famoso por interpretar Harry Potter nos cinemas, é o mochileiro israelense Yossi Ghinsberg. Na dúvida sobre o que fazer da vida, ele resolve viajar o mundo —caso você já tenha se hospedado em hostel, pelo menos um dos hóspedes tinha esse perfil.

Enquanto percorre a América do Sul, conhece o professor suíço Marcus (Joel Jackson) em uma comunidade alternativa, e esse lhe apresenta o fotógrafo americano Kevin (Alex Russell). Quando viajam a La Paz, o protagonista é abordado pelo austríaco Karl (Thomas Kretschmann), que lhe fala sobre as maravilhas de uma tribo desconhecida, onde será possível encontrar ouro. Quem cai em uma história dessas, né?

Yossi cai e ainda convence os dois amigos a embarcarem na história. A justificativa? Conhecer algo novo e sair do marasmo. Afinal de contas, todos vão para Machu Picchu, no Peru.

Cena de “Na Selva”, com Alex Russell, Daniel Radcliffe, Joel Jackson e Thomas Kretschmann (Divulgação)

Os quatro se embrenham pela Amazônia boliviana, visitando aldeias remotas, se alimentando de frutas locais e animais caçados, inclusive um macaco.

Com o passar dos dias e da dificuldade para chegar ao destino desejado, eles vão mostrando suas índoles. Quando o suíço começa a atrasar a caminhada, por estar fraco (ele não encarou carne de macaco) e com os pés desgastados, o americano, amigo de longa data, passa a evitá-lo.

Em determinado momento, o grupo se divide: o israelense e o americano querem seguir viagem em uma jangada rústica pelo caudaloso rio, enquanto o guia austríaco e o suíço pretendem voltar pela mata fechada. Os dois que enfrentaram a água acabam se separando, e Yossi se vê perdido.

A selva, então, ganha protagonismo, subjugando o mochileiro. E é aí que Daniel Radcliffe mostra uma atuação convincente, enfrentando seus medos, passando raiva enquanto se perde, mostrando desespero.

Joel Jackson (Marcus) e Thomas Kretschmann (Karl) entregam boas interpretações, principalmente o primeiro, como um viajante que se sente um fardo para o restante do grupo. Só Alex Russell (Kevin) que deixa a desejar, não demostrando os sentimentos necessários na busca pelo companheiro.

Em “Na Selva”, Daniel Radcliffe dá vida ao mochileiro israelense Yossi Ghinsberg (Divulgação)

A história de “Na Selva” (2017) pode ser considerada uma versão anos 1980 de “Na Natureza Selvagem” (2007). Tanto Yossi quanto Chris McCandless não se adaptam à vida que a sociedade impõe e viajam para conhecer o mundo, enquanto descobrem a si mesmos.

Enquanto o israelense se embrenha pela selva amazônica, o americano viaja pelo interior dos EUA. Ambos conhecem pessoas durante a jornada e se entregam a esses novos relacionamentos, seja para se aventurar junto, seja para dividir uma casa ou um trabalho.

Além disso, as intempéries os levam a situações extremas em meio à natureza, mostrando o quanto o ser humano é pequeno em relação ao meio ambiente.

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Em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Aviso aos passageiros 1: Caso tenha tempo para ver outro filme de viagem, há o road movie “4L”, que mostra uma expedição pelo Saara

Aviso aos passageiros 2: Se você se interessa também por livro ou podcast, dei aqui duas sugestões que envolvem viagens

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Viajante compartilha suas aventuras na Argentina e no Chile https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/06/01/viajante-compartilha-suas-aventuras-na-argentina-e-no-chile/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/06/01/viajante-compartilha-suas-aventuras-na-argentina-e-no-chile/#respond Mon, 01 Jun 2020 18:15:46 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/05/15907061555ed03feb20f3e_1590706155_3x2_md.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=392 Muita gente conta os dias para as férias, ou para ficar em casa (como nos tempos atuais) ou para sair da cidade. Tem alguns que vão mais além, planejando uma viagem de vários meses.

Esse foi o caso de Adriano Ferreira (@diano_ferreira), que, aos 26 anos, viu que era possível passar uma temporada conhecendo outros lugares do mundo. A primeira viagem internacional dele já foi essa longa jornada.

Em um ano e meio, percorreu 12 países e passou por mais de 40 cidades. De lambuja, escreveu um ebook sobre alguns causos da vida, o “As Aventuras de um Jovem Chamado Adriano Ferreira”.

Para o blog, ele contou como foi o início dessa jornada, quando conheceu a Argentina e o Chile, e como foram as experiências de ficar em hostel e pegar carona.

Em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Em dezembro de 2015 comecei os planos financeiros para passar por quantos países eu pudesse. Os que conheci foram Argentina, Chile, Peru, Bolívia, Colômbia, Equador, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Guatemala, Belize e México.

Comecei a minha tão sonhada viagem em julho de 2016. Eu, que sempre fui caseiro, não consegui convencer as pessoas que iria sair de casa pela primeira vez. A minha mãe e a minha vó somente acreditaram quando me viram chegando em casa com a mala, dois meses antes de partir.

Quinze dias antes da data do voo, eu já tinha começado a escrever o meu primeiro ebook, “As Aventuras de um Jovem Chamado Adriano Ferreira”, com uma série de fatos inusitados da época da escola e até mesmo inacreditáveis relacionados ao meu primeiro destino dessa viagem (Buenos Aires). Contei também na história o início dessa viagem em 2016.

Como o primeiro mês de viagem foi planejado para ser mais confortável, primeiro me hospedei sozinho em um apartamento e depois aluguei quartos de casas e fiquei em hostels.

Buenos Aires tem lugares bem preservados e artísticos que me cativaram, como a Casa Rosada, o bairro de San Telmo, onde encontrei a famosa Mafalda das tirinhas do Quino, e os parques, que são lugares onde eu mais gosto de passear.

Como praticava corrida, sempre ia até os Bosques de Palermo para colocar em dia o meu exercício físico. Também visitei Tigre, cidade que fica a uma hora de trem da capital portenha. O Museu de Arte de Tigre me surpreendeu pelo requinte da sua decoração e arquitetura.

Como só tinha reservado o apartamento em que estava por um mês, e meu voo para o Chile era dali quatro dias, decidi alugar um quarto para conhecer alguém local e não ficar sozinho.

O meu anfitrião, logo de início, me causou um certo receio. Ele veio ao meu encontro, no lugar que tínhamos combinado, com uma capa colorida nas costas, feita de diversos pedaços de panos quadrados de diferentes cores, que esvoaçava enquanto pedalava. Além disso, ele falava alto com estudantes uniformizados que passavam no meio da rua e os avisava para não estudarem, pois tudo seria mentira.

Depois tentou subir em um enorme abacateiro. É engraçado, mas, quando você está hospedado na casa de uma pessoa com esse comportamento, isso pode te deixar desconfortável com as próximas reações. Então, após dormir uma noite na casa dele (e muito mal dormida, diga-se de passagem), preferi mudar de hospedagem.

Consegui alugar, em cima da hora, um misto de residência com hostel e saí da casa do meu anfitrião no fim da tarde. Ele não entendeu por que eu estava saindo depois de um dia, tendo reservado mais três, e dei uma desculpa qualquer.

Na minha terceira hospedagem em Buenos Aires conheci a Jessica, da Cidade do Panamá. Conversamos e contei os meus planos de viajar para vários lugares, inclusive o Panamá. Eu tinha planejado até a data de chegada no país. Ela disse que me receberia em sua casa quando eu fosse para lá e fiquei feliz por tamanha hospitalidade.

A visitei depois de quase 8 meses. A casa, onde mora com o marido, era confortável, com um quarto para mim. O pôr do sol do Panamá é o mais bonito que vi durante toda a viagem. A cidade tem uma mistura de ambiente urbano desenvolvido com a paisagem litorânea que é diferente.

Vista do Cerro San Cristóbal, em Santiago (Arquivo pessoal)

Após a Argentina, fui ao Chile, onde me surpreendi com a estrutura urbana e natural da região. Vi a neve das montanhas de longe logo na chegada. Em Santiago, a primeira cidade que visitei, aluguei um quarto no apartamento de uma venezuelana. Ela me levou para conhecer alguns pontos turísticos, como o Cerro San Cristóbal, de onde você tem uma vista ampla da capital, e ao Mercado Central, repleto de comidas típicas.

Eu, minha anfitriã e sua irmã combinamos um passeio no Valle Nevado, já que eu queria muito ter contato com a neve, que para mim era quase que igual caviar. Só tinha visto em imagens e vídeos, mas não tinha tocado ainda. Esse dia foi um dos pontos altos da minha viagem no quesito diversão. Até descida em uma pequena prancha pela neve teve.

No local conheci um grupo de pessoas do Equador que, quando eu disse que era brasileiro, já começaram a dançar e cantar: “Nossa, nossa, assim você me mata…”. Eu não tinha noção do quanto essa música é famosa no mundo todo.

Na culinária, as empanadas chilenas são uma delícia, mas o que me causou admiração foi ver que é comum eles comerem o abacate na bolacha de água de sal. Eu falava que fazia uma vitamina com a fruta, açúcar e leite, e eles também estranhavam.

Depois de muitas recomendações da minha anfitriã de Santiago, fui conhecer a cidade artística Valparaíso. Inicialmente o plano era viajar alugando quartos, mas isso mudou depois que me hospedei em um hostel lá. Vi que a interação era muito maior e assim eu teria mais contato com viajantes de várias partes do mundo. Muitos hóspedes eram europeus da França, Itália, Alemanha, Inglaterra e Espanha.

Um hostel é bem animado para quem quer se entreter. No entanto, eu estava querendo concluir o meu ebook. Precisava de um lugar mais tranquilo e um espaço mais reservado para me concentrar, pois estava em quarto compartilhado. Então, lá fui eu alugar mais um quarto, dessa vez na vizinha Viña del Mar, que é linda, limpa e tem uma estrutura para passeio na beira do mar –por sinal, geladíssimo. Poucas pessoas se atreviam a colocar os pés na água. A paisagem, no fim de tarde, compensava a caminhada pelo calçadão.

Os anfitriões, um casal de jovens chilenos, me receberam muito bem. Tendo um quarto só para mim, finalmente consegui escrever a minha história.

Estava feliz, tinha conseguido concluir o meu ebook e ia viajar para diversos países. Nunca imaginei que fosse para mais de 40 cidades em 12 países. Em uma das situações mais difíceis que passei –foram várias, já que a vida não é só flores–, eu estava no deserto do Atacama, no norte do Chile. E tinha decidido conhecer de bicicleta o Valle de la Luna. Reservei a bike no hostel onde estava, coloquei uma mochila pequena nas costas com uns 2 litros de água e uns lanches e fui.

Eu estava em um deserto, mas só foi cair a ficha depois que eu tinha pedalado uns 10 km. O ambiente é inóspito, seco e bem quente. Meu Deus, eu não ia voltar tudo de novo para nada. Então decidi seguir em frente para conhecer o parque, mesmo estando bastante cansado. Quando chego na porta de entrada, a minha água estava quase acabando.

Na recepção do local, quase caio para trás quando recebo a informação de que o Valle de la Luna tem dez quilômetros, mas ainda faltavam mais cinco para a entrada oficial. Eu já estava lá, tinha que encarar a aventura.

Fui pedalando. E quando achei que já estava me colocando no limite, conheci duas chilenas no meio do caminho que estavam fazendo o passeio a pé desde o povoado. Meu Deus. Eu peguei o WhatsApp delas e depois soube que uma não passou bem. Não seria para menos.

Quando cheguei perto de uma região que tem uma duna enorme e do lado havia rochas bem grandes, parecendo montanhas, e com partes que continham sal, eu fiquei fascinado com tanta beleza natural. Então vi que o esforço tinha valido a pena.

Na volta de todo o percurso, a minha bicicleta guerreira não aguentou o tranco bem quando eu tinha saído do parque e acabou tendo o pneu furado. O jeito foi pedir carona pela primeira vez na vida. Um casal de senhores muito simpáticos e gentis me levaram de kombi até o povoado onde eu estava hospedado. Apesar do imprevisto, terminei o dia satisfeito.

A vida é uma surpresa. Posso dizer que essa experiência de vida me mostrou que coisas boas acontecem quando mais precisamos. Não tem como pensar da mesma maneira, depois de uma viagem dessas. Todas as outras histórias são assunto para um próximo ebook ou até mesmo um livro físico.

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Aviso aos passageiros 1: O casal Sandro e Carla visitou a Bolívia em 2017 e conta os desafios de subir o Chacaltaya, pico dos Andes com mais de 5.000 metros

Aviso aos passageiros 2: O policial aposentado Samuel do Lago já escreveu aqui como foi viajar de ônibus pela América Latina com uma mochila nas costas

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Casal conta os desafios de subir o Chacaltaya, na Bolívia https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/05/19/casal-conta-os-desafios-de-subir-o-chacaltaya-na-bolivia/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/05/19/casal-conta-os-desafios-de-subir-o-chacaltaya-na-bolivia/#respond Tue, 19 May 2020 17:45:28 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/05/WhatsApp-Image-2020-05-14-at-11.37.52.jpeg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=382 Em 2017, Sandro e Carla visitaram La Paz, na Bolívia, e aproveitaram para subir a montanha Chacaltaya, próxima à cidade.

A subida não exige equipamentos apropriados, mas sim um bom preparo físico para ir até o topo. E também roupas adequadas, já que lá em cima o frio é congelante.

Como diz Sandro em seu relato, “as rajadas de vento pareciam que penetravam no âmago da alma”. Confira abaixo como foi a experiência para eles.

Eu sei que em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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No inverno de 2017, estive em La Paz.

Nessa viagem, a minha maior expectativa era visitar o Chacaltaya –pico dos Andes com 5.395 metros de elevação. Outrora, fora a estação de esqui mais alta do mundo.

Atualmente, está desativada em razão das alterações climáticas.

Nesse dia, sentíamos um frio extenuante (o termômetro marcava -5ºC). As rajadas de vento pareciam que penetravam no âmago da alma…

Da antiga estação até o pico da montanha, há uma trilha de duzentos metros. Cada passo era feito com um excessivo esforço. Afinal, a altura provocava efeitos deletérios como a náusea e a taquicardia.

Carla até ensaiou um choro ao subir a montanha, mas chegou feliz ao topo (Arquivo pessoal)

Na metade do percurso, a minha esposa quis ensaiar um choro (ela sempre teve um enorme desconforto com a altitude).

Naquele momento, saquei do meu casaco algumas folhas de coca. A planta foi de grande valia para mitigar os efeitos do ar rarefeito. Secularmente, os povos andinos mascavam a “koka” para amenizar o famigerado soroche, o mal da montanha.

Juntos, subimos os metros faltantes.

No pináculo da montanha, fomos recompensados com uma volatilidade de cores e com uma dança de imagens jamais presenciada (os matizes do branco e do cinza variavam segundo o ângulo observado).

Hoje me surpreendo com a bravura da Carla (minha adorável esposa). No fim da subida foi possível vê-la, leve e tranquila, flanando na neve a mais de cinco mil metros de altitude.

Placa de boas vindas ao Chacaltaya (Arquivo pessoal)

Durante este isolamento social, em decorrência da pandemia da Covid-19, memórias como estas têm sido um grande alento. Assim, anelamos que este período de confinamento seja breve, que tudo e todos sejam como antes –o otimismo é imperativo neste momento atual– para novamente crescermos com as experiências, com as descobertas e com os aprendizados das viagens no mundo lá fora.

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Aviso aos passageiros 1: O fotógrafo Sidney Dupeyrat visitou a Patagônia chilena e descreveu ao blog suas paisagens deslumbrantes

Aviso aos passageiros 2: O casal João Paulo Mileski e Carina Furlanetto rodou o Brasil e a América do Sul a bordo de um carro 1.0 e contou as aventuras e desventuras da jornada

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Chile tem destinos deslumbrantes aos viajantes desbravadores, diz fotógrafo https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/04/13/chile-tem-destinos-deslumbrantes-aos-viajantes-desbravadores-diz-fotografo/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/04/13/chile-tem-destinos-deslumbrantes-aos-viajantes-desbravadores-diz-fotografo/#respond Mon, 13 Apr 2020 17:17:29 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/15865585465e90f6521207f_1586558546_3x2_md.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=358 O fotógrafo Sidney Dupeyrat já contou ao Check-in como sua viagem ao Irã, em 2013. Agora, ele traz, com detalhes, sua incursão pela Patagônia chilena.

Ele conheceu o país em 2018 e voltou em 2019, tanto para explorar o sul chileno quanto para rever a mulher que conhecera.

Na segunda visita ao Chile, o fotógrafo e a namorada Camila García foram à pequena cidade portuária Puerto Natales e Torres del Paine que, segundo ele, é “um dos parques nacionais mais impressionantes do mundo”.

Eu sei que em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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O Chile é um destino que tem se tornado cada vez mais popular entre os brasileiros. No entanto, ainda nos restringimos muito à capital Santiago e seus arredores e ao místico e badalado deserto do Atacama.

Nos esquecemos de que, mais ao sul, ali em direção à Antártica, o país andino pode oferecer destinos deslumbrantes aos viajantes mais desbravadores.

E bota deslumbrantes nisso.

Após uma primeira ida ao Chile em 2018, para conhecer a capital e o deserto, fiquei com a certeza de que tinha que voltar. Para rever a mulher que conheci em meio às estrelas do Atacama. E para vivenciar a gelada Patagônia.

Em março de 2019, parti então rumo ao final do continente com minha namorada chilena. O primeiro destino seria a cidadezinha de Puerto Natales, na região de Magallanes.

Puerto Natales, uma pequena cidade portuária, é utilizada como base para a ida a Torres del Paine, um dos parques nacionais mais impressionantes do mundo. No entanto, ela não deve ser relegada ao papel de um local de passagem. Merece ser destino.

O local é lindo. As casas, de no máximo dois andares, são super coloridas. E fazem um grande contraste com o céu –que ora está completamente azul para minutos depois ser coberto de nuvens. O clima patagônico é imprevisível e muda a todo tempo.

As nuvens de Puerto Natales, aliás, merecem o registro: são especiais. Possuem formas estranhas, às vezes se parecem com tornados e furacões, outras com diferentes bichos. Estão sempre presentes na região e dão vida ao céu: uma vez estando lá, é impossível não se pegar olhando para cima.

Após deixarmos as malas na pousada, decidimos ir ao Muelle Historico para observar o entardecer. O cenário no píer era de filme, com a abundância de água, as aves que sobrevoavam e caminhavam pelo local sem se preocupar com a presença humana, e o lento movimento das nuvens que devagar tomavam o espaço que antes era destinado aos raios de sol. Ali conhecemos o garoto Gabriel, de 6 anos, e a mãe.

Ela, publicitária, havia se mudado com o filho de Santiago para Puerto Natales em busca de uma vida com mais calma. O menino, muito curioso e extrovertido, falava sobre o corpo humano, os animais e a cidade que ainda estava sendo descoberta. A mãe explicava que o Gabriel, “um garoto contra o sistema”, não conseguia se adaptar à escola. E que talvez tivesse que mudar de colégio ou passar a estudar em casa. Enquanto isso, ele usava o píer como escola, e descobria a fotografia com a minha câmera, fazendo imagens da paisagem, dos animais e, sobretudo, retratos.

Quando for visitar o Muelle, vale caminhar alguns metros pela avenida costeira para conhecer também o Monumento al Viento, que homenageia algo tão característico da região.

À noite, saímos para jantar fora e experimentamos a Paila Marina –um tradicional ensopado chileno de mariscos. Vale muito aproveitar Puerto Natales, que tem muitos restaurantes com diferentes faixas de preço, para saborear esse e outros pratos chilenos, como o Caldillo de Congrio e o Ceviche.

No dia seguinte, fizemos o tour para as geleiras Balmaceda e Serrano. É um passeio mais de luxo, no qual você paga caro para navegar pelos canais da região. O barco é grande e confortável, o serviço de bordo é bom e a paisagem é muito bonita. A água, as montanhas, as nuvens, estão todos lá. No caminho, conseguimos observar pássaros que parecem pinguins e também leões-marinhos.

Primeiro chegamos próximo à geleira Balmaceda, e você observa do próprio barco o bloco de gelo. Por último, alcançamos o glaciar Serrano, e para avistá-lo é necessário seguir por uma trilha fácil de cerca de 50 minutos.

Na volta você visita uma chácara para experimentar a culinária local e no barco oferecem uísque e suco servidos no copo com gelo milenar –não é uma experiência de todos os dias, né?

Em seguida, chegou o momento do ponto alto da viagem: Torres del Paine. Separamos o primeiro dia no parque para fazer o trekking rumo à base das torres, que é o principal percurso do lugar.

Fizemos o caminho de ida e volta em cerca de 8 horas. Ao longo de um trajeto bem cuidado e super sinalizado, você sobe montanhas, passa por suas encostas, encontra rios e bosques.

Tem que ir preparado para o vento, que é muito intenso. Mas às vezes o sol aparece bem forte, então a dica é ir prevenido com algumas camadas de roupa, para ir colocando ou tirando conforme muda a sensação térmica.

A mescla de cores é uma constante ao longo do caminho. O verde e amarelo da vegetação se misturam ao cinza das pedras, ao marrom da montanha, ao azul do céu e ao branco da neve, visto lá longe.

Achei especialmente bonitas a área próxima ao acampamento Refúgio Chileno e o bosque que fica logo antes da subida final pelas pedras para a base das Torres.

O cenário da base é realmente marcante. O verde esmeralda da água, contornado pelas pedras, direciona o olhar para as torres, imponentes, mais à frente. É início de outono, então a pouca neve restante se concentra no início das torres, enquanto o sol alcança o topo das três, gerando uma variedade de tons e texturas.

Dá vontade de ficar ali por muito tempo aproveitando a paisagem, mesmo com a enorme quantidade de pessoas presentes. Fiquei imaginando como deve ser ali no inverno, em baixa temporada. A mistura de deslumbramento com o que estava diante de nossos olhos e o cansaço pelas quatro horas de caminhada nos fez aproveitar o local com muita calma, como deve ser.

No dia seguinte, alugamos um carro para percorrer outros setores do parque. Como não tínhamos tempo para fazer o circuito W –caminhada de quatro a seis dias– ou o O –de cerca de oito dias– seria essa a única alternativa para conhecermos um pouco mais desse lugar que nos encantou.

Saindo de Puerto Natales dá mais ou menos uma hora e meia dirigindo. Ao longo do caminho, pouco movimento e as placas com a inscrição “Ruta del Fin del Mundo”. Parece mesmo.

As vias pavimentadas dentro do parque são de boa qualidade, e é bem fácil se locomover de um ponto a outro. O caminho é recheado de montanhas, lagos, estepes, rios, cachoeiras e guanacos, animal típico da região.

É um contraste de paisagens e cores que dificilmente sairá da memória. O clima também varia bastante, e o céu patagônico é capaz de oferecer no mesmo espaço um azul intenso e as nuvens carregadas que anunciam a próxima chuva. Essa mistura de sol e água explica a grande quantidade de arcos-íris que pudemos observar no caminho. Um presente da natureza.

O Lago Nordenskjold é o que mais me marcou nesse passeio, pela cor vibrante da água e da vegetação ao redor. Também pela incrível vista da cadeia de montanhas logo na frente.

Mas o lago Grey também é belíssimo, com sua proximidade com as geleiras. Foi ali que melhor pudemos observar a potência da diversidade daquele céu mágico.

Outro ponto que vale a parada é a Cachoeira de Salto Grande.

Infelizmente era chegada a nossa hora. Ainda tínhamos outros locais para conhecer no sul chileno, e por isso começamos a deixar o Parque para tomar o caminho de volta para Puerto Natales.

Devagar. Seguindo o conselho do nosso guia no passeio pelas geleiras: “Aquele que vem à Patagônia com pressa perde o seu tempo”.

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Aviso aos passageiros 1: Por falar em fotógrafo, a Folha já mostrou algumas imagens de pumas feitas por João Marcos Rosa em sua expedição à Patagônia

Aviso aos passageiros 2: Se você gosta de imagens, há também as fotos da Nêssa Florêncio, que registrou as paisagens e as cores do Parque Nacional Torres del Paine

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Amigos viajam de moto entre Brasil, Uruguai, Argentina e Chile https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/04/10/amigos-viajam-de-moto-entre-brasil-uruguai-argentina-e-chile/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/04/10/amigos-viajam-de-moto-entre-brasil-uruguai-argentina-e-chile/#respond Fri, 10 Apr 2020 17:34:00 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/04/15864868365e8fde346691f_1586486836_3x2_md.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=353 Os amigos Leandro Mercali e Edevir Zaccaria se desafiaram, em 2016, a fazer uma grande viagem com motos de 125 cilindradas.

Dois anos depois, conseguiram cair na estrada e percorreram quase 6.000 km. Eles rodaram cidades do Rio Grande do Sul, Uruguai, Argentina e Chile.

No caminho, enfrentaram furto de um dos veículos e temperaturas baixíssimas na Cordilheira dos Andes.

Confira abaixo os perrengues e alegrias enfrentados pelos amigos.

Eu sei que em tempos de coronavírus não podemos viajar, e muitas vezes nem sair de casa. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Tudo começou em 2016, quando eu e meu amigo Edevir comentamos sobre fazer uma viagem com motos de 125 cilindradas, inicialmente até o Uruguai. A partir daí falávamos de vez em quando a respeito, mas sem muita euforia.

Em outubro de 2017 comentamos novamente sobre o assunto e dissemos: ou a gente vai de uma vez, ou nunca mais tocamos no assunto. Então decidimos nos reunir para definir alguns pontos importantes sobre a viagem.

Surgiu a ideia de ir até o Chile, mas, como pensávamos ser impossível, voltamos a pensar somente no litoral do Uruguai. E marcamos uma data de saída: 10 de março de 2018.

Em janeiro determinamos quantos dias podíamos ficar em viagem, que foi 15 dias, mas já com a retomada da ideia de ir até o Chile. A rota coube a mim definir, já que o Uruguai eu já conhecia e meu amigo, não.

Determinamos custos diários de no máximo R$ 250 de hotel com café da manhã para os dois e ajustamos rotas e metas de quilômetros rodados no primeiro dia. Se não fosse assim, o Chile ficaria de fora e iríamos só até a Argentina.

Na madrugada do dia 10 de março, às 5h, saí de Veranópolis (RS) com uma Biz 125 ex ano 2014, passando por Bento Gonçalves (RS), onde morava o Edevir. Com sua CG 125 Fan ano 2012, seguimos sentido Porto Alegre, Pelotas, Santa Vitória do Palmar e ingressamos no Uruguai por Chuí (RS).

Entrando no país vizinho, passamos por várias cidades que eu também não conhecia e chegamos a Punta del Este às 23h45, totalizando 1.130 km no primeiro dia.

O segundo dia da viagem foi para descansar em Punta, que é linda demais. Aproveitamos e fomos até a Casapueblo, museu e hotel construído a mão pelo artista Carlos Páez Villaró (1923-2014) em Punta Ballena.

No dia seguinte viajamos por Piriápolis, Montevidéu e fomos até Colônia do Sacramento.

No quarto dia fizemos a travessia para Buenos Aires de barco, num “Buque bus”, e pernoitamos lá –sempre escolhíamos onde ficar por aplicativo de hospedagem. À noite fomos até o Puerto Madero caminhando, o que é um show à parte. Buenos Aires é linda e relativamente segura.

Na volta para o hotel, a surpresa: roubaram a moto do meu amigo no estacionamento.

Por sorte a polícia a recuperou, mas com o chicote elétrico totalmente cortado. Passamos a madrugada na delegacia dando esclarecimentos. Quando liberaram a moto, às 5h, a empurramos até o hotel escoltados pela polícia, já que não funcionava mais.

Acordamos às 7h e, como temos conhecimento em mecânica e elétrica, desmontamos a moto e refizemos toda a parte elétrica. Com algumas ferramentas e fita isolante que o encarregado da manutenção do hotel nos emprestou, às 10h ela estava funcionando novamente.

Neste dia seguimos a Rosário e depois até Cañada de Gomez, onde mora a Liliana. A conheci pelo Facebook um tempo antes porque ela tem o mesmo sobrenome que eu. Dormimos no hotel onde ela trabalha, o Verde Sole –bem aconchegante, por sinal.

No 6º dia viajamos para Villa Maria, onde dormimos na beira da estrada logo após o almoço, numa sombra e de barriga cheia –fazia 38 ºC. Depois passamos por Rio Cuarto, Villa Mercedes e San Luis, onde pernoitamos.

No dia seguinte rumamos para Mendoza e vimos a imagem mais esperada da viagem ao longe: as montanhas da Cordilheira dos Andes. Choramos de emoção. Passamos o dia na cidade.

No outro dia, o 8º, desbravamos a Cordilheira com temperaturas de até 0 ºC e chegamos a Santiago, no Chile.

A volta

O retorno foi pelo mesmo caminho até Rosário, e depois seguimos por Nogoyá, Federación, San Jaime de la Frontera e entramos no Brasil por Uruguaiana. Aí passamos por São Borja, Ijuí, Passo Fundo e Veranópolis.

Foram 5.942 km em 12 dias de viagem e sem nenhuma gota de chuva. Não tivemos problemas mecânicos, mesmo andando com as motos nos limites de giro dos motores, e nenhum pneu furado. Detalhe: sempre trocávamos o óleo dos motores a cada 1.500 km.

Nossa velocidade em viagem era sempre acima dos 100 km/h, chegando muitas vezes ficar longos períodos a 140 km/h. As estradas e o combustível de boa qualidade ajudavam muito.

Sem dúvida foi a experiência mais incrível das nossas vidas. Conhecemos muitas pessoas que admiravam nossa aventura e a nossa coragem, já que, para muitos, fazer uma longa viagem com motos de baixa cilindrada é coisa de outro mundo. Policiais tiraram selfie conosco. E grupos de motoqueiros do Brasil e da América do Sul queriam saber da nossa trajetória.

Indescritível! Sigam #uruguaiargentinachiledebiz125 para ver nossas fotos.

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Aviso aos passageiros 1: O mineiro Thiago Guido já contou ao Check-in como foi a sua jornada de moto pelo sul da América do Sul

Aviso aos passageiros 2: O casal João Paulo Mileski e Carina Furlanetto compartilhou um pouco de sua viagem pelo Brasil e América do Sul em um carro 1.0

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