Check-in https://checkin.blogfolha.uol.com.br Relatos de turistas, dicas e serviços de viagem Wed, 01 Dec 2021 12:49:26 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Sem reservas ou cartão de crédito, casal de mochileiros relembra como era viajar em 1985 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/08/10/sem-reservas-ou-cartao-de-credito-casal-de-mochileiros-relembra-como-era-viajar-em-1985/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/08/10/sem-reservas-ou-cartao-de-credito-casal-de-mochileiros-relembra-como-era-viajar-em-1985/#respond Tue, 10 Aug 2021 13:15:04 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/08/1628308223610e02ff2f415_1628308223_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=779 Perrengue, segundo o dicionário Houaiss, é o mesmo que situação complicada, difícil de ser resolvida. No mundo das viagens, muitos usam a palavra quando o pneu fura, chove no passeio ou tem uma fila enorme em alguma atração turística. 

Julio e Rosi Moschen, hoje proprietários de pousadas em Campos de Jordão, têm umas tantas histórias de experiências complicadas em suas viagens. Ainda mais porque o primeiro mochilão deles foi em 1985, na Europa. Você consegue imaginar como era ir até o Velho Continente nos anos pré-internet?

Os dois, que haviam se conhecido em 1979, se casaram seis anos depois e fizeram do mochilão uma espécie de lua de mel. Detalhe: eles viajaram com a irmã e o cunhado de Julio.

A importação de produtos, durante a ditadura brasileira, era reduzida, o que obrigou o casal a viajar com equipamentos nacionais. “A mochila que existia aqui era aquela de lona verde, do Exército, com uma armação de alumínio que ficava nas costas”, relembra Julio.

Enquanto ele carregava essa, Rosi levava uma mala de rodinhas. Bem, não exatamente. “Era uma mala de lona, antigona, e a gente colocava num carrinho metálico que amarrava com cordinha”, explica ela.

Lá, viram como era diferente a vida do viajante europeu, que usava “aquela mochila certinha, magrinha, da largura do corpo”.. E isso influenciava na hora de pegar o trem. Enquanto os estrangeiros andavam entre as fileiras sem esbarrar nos outros, o casal precisava fazer ginástica. “Tinha que tirar a mochila, colocar no chão e entrar com ela de lado, porque ela era mais gorda que a fileira.”

Rosi e Julio, então com 23 e 28 anos, fizeram essa primeira expedição juntos sem hospedagem prevista. “Para fazer reserva no hotel, tinha que ligar para lá, falar a língua do lugar. Na década de 1980 o inglês ainda não era dominante como é hoje, que qualquer um em um hotel da França, da Itália, fala inglês”, explica ele. Para se comunicar, o casal levou um dicionário de seis idiomas. 

Outro item que eles levaram na bagagem foi o livro “Europa a 25 dólares o dia”, de Arthur Frommer, o papa dos livros de viagem, segundo Julio. “Era a bíblia de todo mochileiro da minha época.”

O americano, em sua juventude, viajou bastante pelo Velho Continente e elaborou o guia com dicas de onde se hospedar, se alimentar e o que visitar e ver em várias cidades. E tudo isso com um orçamento de US$ 25 diários. Ele atualizou a obra por anos e, obviamente, teve que adaptar o orçamento diário. 

O livro norteou Julio, a esposa, a irmã e o cunhado. Para passar os 21 dias de viagem, eles foram com US$ 2.000 no bolso. “Não tinha cartão de crédito internacional, para viajar era o ‘cash’. A gente levava dinheiro contado e torcia para que não acontecesse nenhum imprevisto”, relembra Rosi. 

E a situação econômica e política no Brasil era tão complicada que quem viajava para o exterior precisava recorrer ao câmbio paralelo para conseguir mais moeda estrangeira do que o governo permitia.

Para economizar, os quatro ficavam juntos em quartos de hotéis, muitas vezes sem banheiro no mesmo cômodo. Outra forma de baratear os custos era viajar em trens noturnos, e assim deixavam de gastar com hospedagem. Mas, segundo Julio, era difícil descansar e a experiência não era segura. E, mesmo assim, ainda utilizaram esse método seis vezes.

A expedição deles englobou Espanha, França, Mônaco, Itália, Áustria, Alemanha, Suíça e Reino Unido. “A gente viajava como se fosse a única vez da sua vida, tinha que conhecer o maior número possível de países”, explica ele. 

Muitos países é sinônimo de muitas moedas. Assim, quando entravam em um local novo, se viam obrigados a fazer conversões e, consequentemente, perdiam dinheiro em taxas e cédulas de pouco valor. No fim, o orçamento diário acabava ficando abaixo dos US$ 25 previstos por pessoa.

Com tanto perrengue, é provável que muita gente mudasse o estilo de viagem, certo? Eles não. Preferiram manter o ritmo e fizeram um segundo mochilão para a Europa, em 1989, quando Rosi estava grávida de seu primogênito.

Nesses quatro anos eles foram algumas vezes para os EUA e compraram outra mochila, aposentando o modelo do Exército, usado em 1985. Agora, Julio levava um tipo mais confortável, enquanto Rosi usava uma versão menor, já que estava grávida.

A segunda expedição ao Velho Mundo envolveu Suíça, Itália, Grécia e Áustria, na mesma pegada de gastos reduzidos. Foi em terras gregas, inclusive, que eles pilotaram uma moto sem farol, apenas com luz de freio, à noite e na beira de um precipício. Para ficar mais seguro, eles iam pelo acostamento na contramão. Acho até que esse tipo de perrengue deveria inclusive constar no exemplo do Houaiss.

Após a viagem de 1989, ficaram um bom tempo sem colocar o pé na Europa. Veio o segundo filho e Rosi e Julio se dedicaram a viajar pelos EUA, pois viam mais opções de entretenimento e infraestrutura para a família toda.

Só em 2007 eles se organizaram para visitar o Velho Continente novamente. A intenção original era que os filhos adolescentes fossem juntos, todos com mochila nas costas. Mas a ideia não foi bem recebida pelos jovens, que preferiram passar as férias na casa de amigos.

O casal até considerou o uso de malas, mas um vizinho, com idade próxima a deles, botou pilha sobre viajar de mochila. “A gente já é tiozinho, será que a gente ainda é mochileiro?”, se perguntaram. No fim, adotaram a marca Tiozinhos Mochileiros e partiram. “Redescobrimos como é legal viajar assim”, diz ele.

Rosi e Julio têm 59 e 65 anos, respectivamente, e uma situação financeira confortável. Mesmo assim, eles ainda viajam com mochila nas costas, cada uma com 8 kg e cheias de conselhos.

Ele recomenda, por exemplo, não levar camisa polo, por ser mais pesada e difícil de secar. E como lavar? “Na pia do banheiro. Põe o sabãozinho do hotel, xampu, deixa de molho na água quente, sai para jantar ou passear, volta, enxuga e pendura. No dia seguinte está seco.” 

Se não secar, Julio recomenda embrulhar no plástico, guardar na mochila e pendurar no próximo hotel. “A dica é torcer a roupa dentro da toalha, aí ela não fica pingando e seca rápido”, completa Rosi. E, se possível, levar corda de nylon para usar como varal.

Não sei a sua, mas a minha meta da vida foi redefinida após conhecer os tiozinhos mochileiros.

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Aviso aos passageiros 1: Além de um canal no Youtube, eles bateram um longo papo no podcast Mochileiros sem Pauta, que eu já recomendei por aqui

Aviso aos passageiros 2: Reuni algumas dicas para fazer seu primeiro mochilão. Inclusive, relato como foi a minha primeira viagem com a mochila nas costas e todos os perrengues no livro “Embarque Imediato” (O Viajante, R$ 39,90, 180 págs.)

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Ouça 9 podcasts para quem faz mochilão, viagem de carro ou é nômade digital https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/02/22/ouca-9-podcasts-para-quem-faz-mochilao-viagem-de-carro-ou-e-nomade-digital/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2021/02/22/ouca-9-podcasts-para-quem-faz-mochilao-viagem-de-carro-ou-e-nomade-digital/#respond Mon, 22 Feb 2021 20:51:26 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2021/02/16046646095fa53d217021b_1604664609_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=661 Companheiros da limpeza da casa, do caminho para o trabalho ou da corrida, os podcasts fazem parte da rotina de muita gente. E várias pessoas têm aproveitado também na hora da viagem, para se entreter em longas horas de voo ou de estrada.

Por essas e outras, listo nove programas voltados para os viajantes. Há para quem gosta de fazer mochilão, ouvir histórias, rodar de carro por aí, se embrenhar na natureza ou é adepto do nomadismo digital.

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Mochileiros Sem Pauta (@mochileiros.sempauta)
Como o próprio nome já diz, o podcast é feito por e para mochileiros. Conduzido por Cainã Ito (@caina.ito), que nos últimos anos viajou pela África, o programa traz na bancada ao menos 3 convidados.

Já passaram por lá alguns viajantes que escreveram para o Check-in, como Rafael Dallacqua, Davi Montenegro e Rebecca Alethéia. E eu, que faço minha estreia nessa área no programa “Choques culturais”.

Desde junho de 2019 no ar, o programa quinzenal aborda diversos assuntos. Há aqueles mais voltados a viajantes de baixo custo (como Couchsurfing, “perrengues no busão”, hostels e comida de mochileiro), sobre países específicos (Chile, Irã, Índia, Egito e Etiópia) e temas mais complexos (em especial o “Estereótipos africanos”, “Viagens alucinantes” e “Mochilando em terras muçulmanas”).

Pode interessar: o Roda Mundo, do Ricardo Martins (@thebambootrip), também é voltado a mochileiros e debate assuntos como mulheres na estrada e viajantes negros.


Viajar pra Quê? (@viajarpraquepodcast)
O casal Tainá Rodrigues e Marcelo Castro (@temaiseme) comanda o projeto, que traz semanalmente um viajante para a bancada. Da pergunta inicial, que dá nome ao podcast, a conversa flui para os mais diferentes assuntos relacionados à experiência do entrevistado.

Das pessoas que já escreveram para o Check-in, a lista tem Beatriz Pianalto, Rebecca Alethéia, Guilherme Canever e Caio Giachetti.

Como o podcast é centrado na vida da pessoa, variam os tipos de programa. Há aqueles mais voltados à viagem (Cainã Ito, Igor Ivanowsky) e os que tiveram sua vida mudada junto com a jornada (Babi Cady, Riq Lima).

Pode interessar: o Descobre a Mochila!, como a própria Juliana Nair (@descobreamochila) define, traz “histórias e reflexões sobre viagens transformadoras”.


Papo Outdoor (@papooutdoor)
Comandado por Wilton Nascimento, Lenon Cesar e Emanuel Silveira, o projeto, como o próprio nome já diz, é voltado ao lado aventureiro das viagens.

Quinzenalmente, o trio convida pessoas para falarem sobre trekking, escalada e ciclismo, entre outros esportes. E a bancada pode ser formada tanto por viajantes solitários quanto por casais ou até três amigas (o episódio sobre a trilha até o Acampamento-base do Everest é meio confuso por causa das seis pessoas falando, mas é bastante informativo).

Pode interessar: o mais antigo da lista, o Extremos (@extremos) tem mais de 340 episódios, e aborda todo e qualquer tipo de expedição em meio à natureza.


Viajo logo Existo PodCast (@viajologoexisto)
O casal Raquel e Leonardo Spencer rodou o mundo num carro 4×4 e conheceu dezenas de países. Depois de lançarem alguns livros sobre o que viram por aí, eles se embrenharam no mundo do podcast, de mesmo nome.

Semanalmente, abordam temas envolvendo viagens específicas (Tchernóbil, Jalapão, Itália) ou relembram experiências (como enviar um carro de navio de um lugar para outro ou como trabalhar na estrada).

Pode interessar: com quatro pessoas na bancada, o Pandora on the Cast (@pandoraontheroad) também tem essa pegada de quem viaja de carro e conta histórias envolvendo países, em sua maioria na Europa.


Perdidos (@nomadlikealocal)
Pablo Magapo e Barbs Medeiros deram um tempo do Rio de Janeiro e caíram na estrada como nômades digitais. Durante o caminho, resolveram contar um pouco dessa nova vida no podcast.

A primeira temporada traz episódios bem informativos sobre o processo de mudança, desde a quais contas encerrar a o que levar na mala. Eles também falam sobre a experiência de morar na Itália, Canadá, Sérvia e Portugal, países onde viveram enquanto estavam fora, e dão dicas sobre o que atentar na escolha de um apartamento pelo Airbnb.

Na segunda temporada, gravada já no Brasil durante a pandemia, o casal entrevista pessoas com experiências diferentes focando temas importantes à vida nômade, como os gastos na estrada, preparativos para um motorhome e como conhecer gente num lugar novo.

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Em tempos de coronavírus nossas viagens ficaram mais restritas. Mas ainda podemos relembrar momentos marcantes que tivemos em outras cidades. Que tal compartilhar sua história de viagem com o blog Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Aviso aos passageiros 1: A Folha tem uma gama variada de podcasts. Vale a pena conferir a lista

Aviso aos passageiros 2: Também na Folha, há uma seção de críticas de podcasts, o Escuta aqui

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Viajante compartilha o que aprendeu em seu mochilão por Espanha e Portugal https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/01/07/viajante-compartilha-o-que-aprendeu-em-seu-mochilao-por-espanha-e-portugal/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2020/01/07/viajante-compartilha-o-que-aprendeu-em-seu-mochilao-por-espanha-e-portugal/#respond Tue, 07 Jan 2020 13:38:33 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2020/01/15783612145e13e17e6d67c_1578361214_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=255 O viajante é um compartilhador por natureza. Gosta de mostrar aos outros histórias, fotos e suvenires. E há aqueles que também dividem seus aprendizados.

Este é o caso do Bruno Barros (@talvezbrunobarros), que fez um mochilão de três meses por Portugal, Espanha e Inglaterra.

Ele conta que partiu para a Europa com uma mochila nas costas, inúmeros questionamentos sobre si mesmo na cabeça e pouco planejamento na agenda.

Abaixo, Bruno compartilha aprendizados de sua jornada de três meses e também algumas respostas de suas dúvidas pré-viagem.

Alguma viagem sua rendeu boas histórias e aprendizados? Que tal mandar seu relato para o Check-in? É só escrever para o email checkin.blogfolha@gmail.com

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Em 2 de junho de 2019 eu saí de casa apenas com uma mochila nas costas. Eu passaria os próximos três meses na Europa e nela estava tudo que acreditava precisar.

Sem uma passagem de volta, eu nem mesmo tinha certeza de quais lugares iria visitar. A ideia era me testar. Queria aprender ao máximo com a experiência, pois seria a primeira vez que iria viajar com tão pouco planejamento. Mas por que eu estava fazendo tudo isso? Será que era a hora certa, afinal eu tinha pedido demissão poucos meses antes? Será que estava fugindo de algo ou indo ao encontro do que não tenho em casa?

Assim, viajei querendo algumas respostas, pois a verdade é que tinha dúvidas que pareciam mais pesadas que minha mochila.

Com o plano de praticar espanhol, minha intenção era ficar mais na Espanha. Peguei um voo para Lisboa apenas porque o preço era imbatível e, após uma semana por lá, fui ao país vizinho.

Acabei passando por três países (Portugal, Espanha e Inglaterra), dez cidades e ainda morei por um mês ao lado de um vulcão, em Tenerife. Chorei, sorri, me apaixonei, me aventurei, me desafiei, permiti me perder. Ao fim, a verdade é que foi pura inocência achar que melhorar meu espanhol seria o melhor fruto da viagem.

Assim, resolvi reunir em meu relato não um roteiro dos lugares por onde passei. Trago experiências e sentimentos que tive a oportunidade de viver. Mostro os aprendizados que cada situação me proporcionou e acabou me tornando uma pessoa diferente.

Aprendi a ser um mochileiro mais preparado para encarar novas aventuras e resolvi compartilhar. Quem sabe outros não aproveitam o aprendizado? E aqui vai um leve spoiler: foi após essa viagem que decidi que estar na estrada se tornaria meu estilo de vida e hoje não tenho endereço fixo.

Lisboa – aprendi a hora de descansar e escrever

Cheguei a Lisboa pelo aeroporto e aproveitei o preço baixo e rapidez do metrô para ir ao hostel. Eu nunca fui à capital portuguesa e nesta viagem tinha decidido não pesquisar muito sobre os lugares onde iria ficar, assim não sabia sobre os pontos turísticos próximos.

Eram 6h da manhã e meu hostel não estava preparado para me receber tão cedo. Decidi andar pela cidade e fui parar na praça do Comércio. Achei a vista linda e percebi que em Lisboa dava para passear sem destino por alguns dias.

Só iria pesquisar a fundo nos últimos dias para não perder nada muito importante. A cidade é um museu a céu aberto e, quem fala português pode se encantar em cada conversa com os nativos do bairro de Alfama, por exemplo.

Fiquei por lá sete dias e aprendi muita coisa. Por exemplo: não beber muito ou dormir tarde quando for mudar de hostel. Isso aumenta o risco de algo dar errado e o cansaço me deixa sem energia para lidar com surpresas ruins –esse sentimento pode ser confundido com vontade de voltar para casa. Na primeira semana de viagem isso provavelmente não vai acontecer, mas pode ser o caso depois de meses na estrada.

Outro aprendizado que tive foi de começar a escrever pelo menos uma vez por semana sobre o que estava vivendo. Nas viagens menores eu acreditava que o que fosse importante eu não esqueceria. Estava bem enganado.

Viajar sozinho e aberto a experiências faz cada dia ser muito intenso e as memórias podem se misturar. Uma semana pode parecer um ano. Em Lisboa houve tanta coisa em apenas sete dias que tinha certeza de que se isso acontecesse nos próximos lugares eu esqueceria boa parte de tudo.

Comecei a fazer anotações toda vez que estava indo de uma cidade a outra ou quando ficava mais de uma semana no mesmo lugar. A escrita faz com que eu reviva os momentos e seja capaz de julgar o que acho que poderia ter sido diferente. Além de outras coisas que me divirto, como ver as novas amizades evoluírem. Pessoas que começam sem nome e viram grandes amigos com apelidos dias depois.

Sevilla – passeios a pé para quem viaja sozinho

A primeira coisa que aprendi quando cheguei a Sevilla foi que a siesta –intervalo depois do almoço quando o comércio fecha– na Espanha é algo a ser considerado. Cheguei de ônibus e fui ao centro da cidade pouco depois das 14h. Logo achei que tinha algo de errado, pois estava tudo fechado.

Demorei um pouco para me recordar da cultura de algumas cidades em que o comércio fecha das 14h às 17h. Durante toda minha visita à Espanha eu tinha de me planejar se quisesse resolver algumas coisas nesse horário. Percebi a necessidade de estudar detalhes da cultura local antes de me aventurar. Leis mais rígidas, costumes brasileiros que podem incomodar ou agradar, forma que as pessoas interagem etc.

Foi também em Sevilla que notei que os free walking tours são uma excelente opção para quem viaja sozinho e está sem plano prévio. Eles são passeios que fazemos com guias preparados e ao final damos a gorjeta que acharmos justas –o costume é não dar menos do que 5 euros. Vários mochileiros sozinhos estão nestes passeios, não só querendo conhecer a cidade, mas abertos a combinar algo em outro horário.

Granada – experiência não é só a paisagem

Decidi ir a Granada enquanto tomava meu café da manhã em Córdoba. Estava procurando ingressos para conhecer o Palácio de Alhambra, que dizem ser muito difícil de última hora, e consegui um para o dia seguinte. Pesquisei mais e vi que teria um ônibus saindo em uma hora.

Fiz o check-out e parti em direção à última cidade a resistir à reconquista católica frente aos muçulmanos no século 15. Lá, pesquisei um tour e fui com uma americana que acabara de conhecer. O passeio terminaria pouco antes do pôr do sol e ela disse que a cidade tinha um lugar muito bom para ver o fim da tarde. A vista é fantástica e retornei todos os dias em que estive na cidade para começar minha noite de lá.

Gostei demais de Granada e disse por um tempo que se fosse escolher a melhor experiência na Espanha, seria lá. Claramente a cidade tinha me encantado, assim como as pessoas que conheci lá.

Hoje compreendo melhor que uma viagem pode ser muito boa em um lugar não muito atraente e que pode ser péssima em um lugar ótimo. Recomendar um lugar para alguém se tornou muito mais fácil.

Madri – como conhecer pessoas viajando sozinho

Madri é mais cara do que as outras cidades por onde tinha passado. Procurei formas de economizar e, assim, aprendi outro segredo para quem viaja sozinho e quer conhecer pessoas.

Eu sou alto e como um bocado. Faço refeições que quem vê pode pensar que é demais para apenas um. Dessa forma, cozinhava e convidava quem estivesse por perto. Dividir comida foi uma ótima forma de criar intimidade com outros hóspedes.

Também percebi como pessoas de culturas e idades diferentes se comportam neste tipo de situação. Alguns querem muito dizer “sim”, mas têm dificuldade. Outros topam dividir a refeição de primeira, mas sequer lavam o próprio prato depois. Algumas pessoas não deixam você lavar nada, afinal você cozinhou.

O aprendizado e as amizades que fiz valiam cada ida à cozinha. Assim, recomendo que se aprenda a cozinhar ao ficar em um hostel. Pode ser algo simples, bonito e com um cheiro bom e você, além de economizar, vai conhecer muita gente.

Barcelona – sempre há escolhas 

Barcelona é outra cidade linda da Espanha. Quando cheguei neste ponto já estava claro que o país é repleto de lugares deslumbrantes. Inclusive foi a Espanha que me convenceu a registrar minhas viagens com fotos. Fiz meu primeiro post de Instagram de dentro do Templo Expiatório da Sagrada Família.

A cidade não dorme e no verão há infinitas opções para o turista, de todos os tipos e preços. O sol nasce cedo e se põe apenas por volta das 22h. Adicione isso ao fato de as boates ficarem abertas até o dia clarear. Comecei a compreender que deveria escolher muito bem o que queria fazer.

Muitas vezes, no calor da emoção, dizemos “sim” a tudo que aparece. Minha agenda muito flexível aumentava o risco. Não saber o que quero de forma clara só me fazia entrar em furadas, como também gastar mais dinheiro do que eu podia. Dizer apenas “sim” em Barcelona também me impediria de dormir, o que pode piorar muito a experiência da viagem.

Analisando minhas escritas, fui aprendendo mais sobre os lugares e companhias que me agradavam. Viajar sem um plano fixo não quer dizer que não devemos saber o que esperamos de uma viagem. Curiosamente, a falta de plano me fez aprender muito mais sobre isso. Saber o equilíbrio em estar aberto a experiências novas, mas entender que para algumas coisas o “não” é a resposta mais óbvia é uma arte que todo mochileiro deve aprender.

Na hora de voltar

Na hora de voltar me lembrei das dúvidas que tinha antes de sair da casa. Outras surgiram. Será que tinha mudado tanto que sentiria algum incômodo estando em casa novamente? Mudei, mas as pessoas continuaram as mesmas. Quem sabe eu não tinha era mudado nada? E como seria voltar à rotina? Como seria lidar com a famosa depressão pós-viagem?

Os meses após meu regresso me fizeram perceber que também é bom estar em casa, apesar de todos os obstáculos. Voltar à velha rotina também foi um gostoso desafio. Claro que tem muita diferença comparada à vida na estrada, mas isso não quer dizer que é ruim.

Hoje sou grato por saber que nenhuma das dúvidas me impediu de seguir em frente e por esta viagem me fazer entender que não há um momento certo para pegar a estrada. Se você estiver incomodado de estar onde está ou muito confortável, ambos podem ser motivos para ficar um tempo fora.

Confesso que hoje percebo o tanto que estava feliz na minha cidade. Talvez por isso eu acho que era o momento perfeito para partir. Viajar por aí sem muito destino, com o coração e a mente abertos. Hoje sei que poderia viver o resto da vida no lugar em que nasci. Talvez seja por este exato motivo que ficarei distante por um bom tempo.

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Aviso aos passageiros 1: Reuni algumas dicas para fazer seu primeiro mochilão. Inclusive, relato como foi a minha primeira viagem com a mochila nas costas e todos os perrengues no livro recém-lançado “Embarque Imediato” (O Viajante, R$ 39,90, 180 págs.)

Aviso aos passageiros 2: Já contei aqui a história de três mochileiros: o Davi, jovem que viajou pela África e pelo Oriente Médio, o Samuel, PM aposentado que desbravou a América Latina com uma mochila nas costas, e o Rafael, que passou três meses pelos Bálcãs

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Mochileiro conta como foi viajar por três meses pelos Bálcãs https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/12/17/mochileiro-conta-como-foi-viajar-por-tres-meses-pelos-balcas/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/12/17/mochileiro-conta-como-foi-viajar-por-tres-meses-pelos-balcas/#respond Tue, 17 Dec 2019 13:53:03 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2019/12/15762831805df42c2c1a3d0_1576283180_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=219 Conhecer a Europa é o sonho de consumo de muita gente, e, quando se pensa a respeito, as pessoas facilmente se lembram de Portugal, França e Inglaterra. Fora os lugares mais consagrados, podem até citar países do centro europeu, como Polônia e Hungria. Mas e os Bálcãs?

Caso você nunca tenha cogitado visitar a região, no sudeste do continente, o economista paulistano Rafael Dallacqua (@viajecomintensidade) pode te convencer a ir.

Na estrada desde abril de 2018, o mochileiro já passou por Sudeste Asiático, Índia e vários lugares da Europa. E os últimos três meses foram dedicados aos países balcânicos. 

Enquanto viaja, Rafael pesquisa bastante sobre a história local a fim de entender todas as nuances da região. Para melhorar essa percepção, ele também pega carona e se hospeda na casa dos nativos.

Em tempo: finalizado o período nos Bálcãs, o mochileiro vai passar uma temporada entre Oriente Médio e África.

Você tem alguma viagem legal que deseja compartilhar? Visitou algum lugar que merece muito ser conhecido pelos outros? Escreva para o Check-in pelo email checkin.blogfolha@gmail.com.

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Costumo chamar as minhas viagens de jornadas. E acabei de finalizar uma de três meses pelos sete países que formavam a antiga Iugoslávia (Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegovina, Sérvia, Montenegro, Macedônia do Norte e Kosovo), mais a Albânia. Pode ser chamada de uma viagem pelos Bálcãs, já que todos estão localizados na península Balcânica. 

Uma região praticamente esquecida da Europa, negligenciada nos livros escolares e resumida ao estopim da Primeira Guerra Mundial, mas que eu garanto que vale muito a pena conhecer. Cheia de belezas naturais, muita história, pessoas amigáveis e muito mais econômica do que os países mais famosos da Europa.

Comecei essa jornada pela Croácia, definitivamente o país mais turístico desse grupo e, juntamente com a Eslovênia, o que está mais inserido no bloco europeu –são os únicos que fazem parte da União Europeia.

Para potencializar toda a merecida fama do país, Dubrovnik foi um dos principais sets de filmagens da série de maior sucesso da história, “Game of Thrones”. Como um grande fã, a cidade foi parada obrigatória para mim. 

Depois conheci a badalada ilha de Hvar e de lá segui para destinos menos turísticos e mais tranquilos, como a ilha de Mljet e o parque nacional de Krka, mais barato e menos disputado que os grandiosos lagos de Plitvice. A capital Zagreb também tem seu charme e menos turistas.

A Eslovênia nem estava nos meus planos, mas ainda bem que entrou. Enquanto eu sugeriria passar apenas um dia na pitoresca capital Liubliana, diria para você não contar o tempo na região de Bled.

Parece que saiu de um livro de conto de fadas. A pequena cidade em torno do mundialmente famoso lago Bled é rodeada de montanhas e uma natureza aparentemente intocada, parte do Parque Nacional de Triglav. Para amantes de trekking (fazer trilha) e hiking (caminhada), esse é o paraíso. 

De volta para Liubliana, tomei um ônibus noturno para Sarajevo. Bastou um único dia na capital da Bósnia-Herzegovina para me encantar com a cidade e ter a certeza de que teria que voltar e ficar por mais tempo, pois estava lá só de passagem. 

Foi a partir daí que decidi viajar de carona por esses países. Queria ter mais contato com os habitantes, escutar suas histórias e absorver o máximo de sua cultura. Como eu não me planejava muito, estava com dificuldades de fazer couchsurfing (plataforma para ficar hospedado na casa das pessoas), mas a carona era uma oportunidade perfeita. Além de ser um exercício de paciência, humildade e auto-conhecimento.

A minha primeira foi com um bósnio-sérvio, e comecei a entender a divisão étnico-religiosa da Bósnia, em um velho Volkswagen preto. Zoran devia ter uns 50 anos, não falava muito inglês, mas sabia o suficiente para me contar um pouco sobre si. Falou sobre como a Guerra da Bósnia quase arruinou a sua vida e como ele perdeu um pé ao pisar em uma mina terrestre. 

Dei bastante sorte na minha primeira carona: Zoran estava indo direto a Montenegro, o que já era quase meio do caminho para a Albânia. E o que era para ser apenas uma parada em Montenegro se tornou uma semana. O país me encantou com suas belas montanhas. 

Fiquei alguns dias em Kotor e, ao invés de continuar seguindo a rota mais turística que vai descendo pelas cidades do litoral, preferi me enfiar no interior do país e rumei para o Parque Nacional de Durmitor. Fui parar na casa de uma família na pequena cidade de Zabljak. Os montenegrinos são hospitaleiros e muito sossegados, são tipo os hippies dos Bálcãs. Gostei muito da vibe deles.

Se eu achava que o Triglav era o paraíso para quem gosta de trekking e hiking, é porque eu ainda não conhecia o Durmitor. Que lugar incrível. São tantas montanhas por lá que um dia acabei subindo a terceira maior do país sem saber, o monte Meded. 

No Parque Nacional de Durmitor visitei também o Canyon Tara, que dizem ser o segundo maior canyon do mundo, atrás apenas do Grand Canyon, nos EUA. São mais de 80 km de extensão de um desfiladeiro que chega a 1.300 metros de profundidade.

Me despedi de Montenegro e finalmente cheguei à Albânia. Cruzei de carona também, dessa vez com o albanês Pjeter, que foi o primeiro a me mostrar a hospitalidade desse povo. Os albaneses, na minha opinião, são as pessoas mais gente boa da Europa. Algo que é difícil de explicar o porquê, mas que é muito fácil de perceber quando você tem a experiência.

O país é uma mistura única de influências turca e italiana, com um ar soviético ainda pelas ruas e marcas de um passado recente que não foi nada fácil. Acho que é o único lugar no mundo onde é possível ver cidadelas medievais charmosas, nadar pelado em uma praia paradisíaca deserta e visitar bunkers de guerra abandonados, tudo no mesmo dia.

Em três semanas, rodei a Albânia de norte a sul, sempre de carona. Foi o local mais fácil de consegui-las. 

O mochileiro paulistano passou por Kotor, em Montenegro (Arquivo pessoal)

As nações dos Bálcãs têm muitas diferenças culturais, étnicas e religiosas entre si. É até estranho pensar que em algum momento formaram um só país: a Iugoslávia (lembrando que a Albânia não fazia parte). Dizem que o mérito de manter essa colcha de retalhos unida era do Josip Broz, mais conhecido como Tito, figura polêmica e famosa na região. Ele mesmo dizia:

“Sou líder de um país que tem dois alfabetos, três línguas, quatro religiões, cinco nacionalidades, seis repúblicas, que faz fronteira com sete vizinhos e na qual vivem oito minorias étnicas.”

Mas uma coisa é certa, ou melhor, três coisas. Em todos os países eu encontrei as burekas, uma espécie de torta geralmente recheada com carne, queijo, espinafre ou batata; o stapici, um tipo de salgadinho com manteiga de amendoim dentro; e o ajvar, uma pasta a base de pimentões vermelhos. Em todos os lugares também se pode encontrar excelentes cafés e chás turcos e as suculentas baklavas. Comida é outro ponto forte dos Bálcãs.

Cruzei a fronteira a pé para a Macedônia do Norte. Fui andando ao longo do lago Ohrid, que não só é um dos mais antigos e profundos da Europa, como um dos mais bonitos. Após repor as energias na região, segui para a capital Escópia.

A cidade passou por uma grande transformação nos últimos dez anos, resultado do projeto Skopje 2014, cujo objetivo era justamente dar uma nova cara para a cidade. Portanto, todas as estátuas e prédios imponentes em estilo neoclássico que se pode ver pelo centro e que parecem muito antigos têm, na verdade, menos de uma década.

Outra coisa nova é o nome do país, que passou a se chamar Macedônia do Norte desde fevereiro de 2019. Sem entrar em detalhes, há um disputa entre a Macedônia do Norte e a Grécia em relação à utilização do nome Macedônia. Essa é uma questão séria por lá e que vai muito além de ser apenas uma treta pelo nome –trata-se de identidade cultural.

Meu próximo destino foi o Kosovo, o país (que oficialmente não é um país) mais complicado da região atualmente. As coisas estão tranquilas agora, mas é preciso ter um cuidado com as fronteiras. Teoricamente ainda é uma região autônoma reivindicada pela Sérvia. Portanto, a única maneira legal de entrar e sair do país é cruzando pela Sérvia.

Eu não sabia direito como faria para chegar. Tomei um ônibus de Escópia até Bujanovic, no sul da Sérvia, e de lá cheguei de carona até a capital do Kosovo, Pristina.

Afinal, o que é um país? Kosovo tem um território definido por fronteiras com outros quatro países (possui controle de fronteiras), uma população com identidade cultural (etnia, língua e cultura próprias e diferentes da sérvia), governo e instituições próprios e relações com outros países. Além de bandeira, moeda, passaporte e Exército próprios.

Portanto, é um país, não? Bom, tem cem nações no mundo que o reconhecem dessa forma, mas há outros 93 membros da ONU que não –inclusive o Brasil. Para mim, é um país. Por isso comecei esse texto dizendo que visitei os sete países que integravam a Iugoslávia.

Me surpreendi positivamente. Pristina é uma cidade bem desenvolvida, jovem, liberal e com muita diversidade. É um bom exemplo para se quebrar o paradigma em relação a países de maioria muçulmana serem conservadores, assim como a Bósnia-Herzegovina.

Sarajevo, na Bósnia-Herzegovina, foi um dos pontos que Rafael mais gostou (Arquivo pessoal)

 

Aliás, falando nisso, optei por ficar mais tempo na Bósnia e dessa forma arrumei um trabalho voluntário em um hostel em Sarajevo pela Worldpackers. Para quem não conhece, através dessa plataforma é possível encontrar opções de trabalho não remunerado em mais de cem países, onde você troca algumas horas de atividade semanal por acomodação e outros benefícios, como refeições, por exemplo.

Mesmo com o céu sempre cinzento, Sarajevo me encantou e foi a minha cidade preferida dessa viagem. Há um ar misterioso, ao mesmo tempo em que exala alto astral. Por suas ruas parece que tudo se mistura: o antigo com o novo, o conservador com o alternativo. Depois de tudo o que essa cidade passou em sua história recente, vê-la pulsar nessa sintonia é um exemplo de superação.

Fiquei três semanas e tive a oportunidade de conhecer outras cidades, como Mostar, Jajce e Banja Luka. A minha intenção era conhecer locais com a maioria de cada um dos principais grupos étnicos-religiosos do país: bósnios-muçulmanos (bosniaks), bósnios-croatas (católicos) e bósnios-sérvios (católicos ortodoxos).

Mostar é o exemplo perfeito de como foi a Guerra da Bósnia, uma bagunça de proporções inimagináveis, que fugiu do controle de todos e na qual não houve ganhadores. Todos saíram perdendo e carregando feridas que ainda estão abertas na sociedade.

Tanto Mostar quanto Jajce são praticamente metade cristã (croatas católicos) e metade muçulmana, com a diferença de que na primeira há um clima maior de segregação enquanto que na segunda está todo mundo junto e misturado e, no que me pareceu, em harmonia. Há nas ruas uma sensação de superação, de que as dificuldades e as diferenças sempre podem ser deixadas de lado e que o melhor é viver em harmonia.

Para fechar esse quebra-cabeça faltava só uma peça, a Sérvia. Foi o meu último destino balcânico, porém recomendo que se comece por lá. Será muito mais fácil para entender sobre a Iugoslávia, o governo de Tito, o processo de dissolução, o lado da Sérvia nos conflitos que foram gerados posteriormente, e depois ir conhecendo os outros lados das histórias nos demais países. Lembrando que quando se fala de Bálcãs, nada se resume a apenas dois lados.

Como eu fiz o contrário e terminei a viagem na Sérvia, foi quase que inevitável chegar com uma imagem negativa do país. Principalmente após ter tido tanto contato com a Guerra da Bósnia. Porém, o importante é estar disposto a superar preconceitos e quebrar paradigmas. Aos poucos fui quebrando um a um e no final saí de lá com uma imagem positiva do país.

Na verdade, a Iugoslávia era formada por seis repúblicas e duas regiões autônomas e, como sou um perfeito perfeccionista, minha última parada foi na outra região autônoma que existe na Sérvia, Vojvodina. Fica no nordeste do país e faz fronteira com a Hungria e a Romênia. Enquanto a história lá também não é das mais simples, a situação é bem mais tranquila que no Kosovo. 

No fim de tudo, conheci o filho problemático da Europa, o caldeirão em ebulição, o barril de pólvora. Todos esses são apelidos que já teve essa região. Os Bálcãs são parte de uma Europa sem glamour e sem romantismo. Uma Europa esquecida, cuja história recente coincide com a minha infância e me faz reconhecer os meus privilégios e ser grato por tudo. Conheci, gostei e recomendo.

*

Aviso aos passageiros 1: Reuni algumas dicas para fazer seu primeiro mochilão. Inclusive, relato como foi a minha primeira viagem com a mochila nas costas e todos os perrengues no livro recém-lançado “Embarque Imediato” (O Viajante, R$ 39,90, 180 págs.)

Aviso aos passageiros 2: Já contei aqui a história de dois mochileiros, o Davi, jovem que viajou pela África e pelo Oriente Médio, e o Samuel, PM aposentado que desbravou a América Latina com uma mochila nas costas

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Confira 6 dicas para fazer seu primeiro mochilão https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/12/13/confira-6-dicas-para-fazer-seu-primeiro-mochilao/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/12/13/confira-6-dicas-para-fazer-seu-primeiro-mochilao/#respond Fri, 13 Dec 2019 13:24:23 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2019/12/mochilao-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=213 Para muitos, fazer um mochilão é um modo de viajar. Para outros, um estilo de vida, já que adotam no dia a dia o hábito de ter poucas posses e estar aberto a todo tipo de situação fora do planejado.

Se você está pensando em fazer parte do primeiro grupo, seguem algumas dicas para estrear com o pé direito. Se já viajou com a mochila nas costas, vale a pena ver se a lista traz alguma novidade.

Agora, se você já adotou o mochilão como estilo de vida, pense que esse post é voltado para os iniciantes e mande sugestões para encorpar o texto. O email é checkin.blogfolha@gmail.com.

As dicas daqui foram compiladas a partir da minha experiência de dois mochilões –pela Europa, em 2010, e pela América do Sul, em 2011– e das viagens que fiz nos últimos anos, sempre com uma mochila nas costas (inclusive na lua de mel).

DICAS

1. Mochilão

Antes de mais nada, a ideia do mochilão é viajar com uma mochila (conhecida como cargueira, por comportar muito peso), e não uma mala de rodinhas. Facilita bastante ter as duas mãos livres para segurar mapa/celular/câmera fotográfica ou pedir carona. Além disso, as rodinhas podem atrapalhar na hora de andar na praia ou em ruas antigas de Paraty ou outros centros históricos.

Há vários modelos e marcas de mochila no mercado, tanto estrangeiras (Osprey, Deuter, The North Face, Quechua e Thule) quanto nacionais (Nautika e Crampon). Os tamanhos também são os mais diversos.

Na hora de escolher, além do preço, avalie questões como o conforto nas costas (sua viagem depende do seu corpo), bolsos externos (não é legal tirar tudo de dentro para pegar um bandaid) e divisões internas (roupa suja de um lado e limpa do outro).

Dica de ouro: vale ter uma mochila menor (conhecida como “de ataque”) para levar água, comida e câmera no passeio cotidiano. Há modelos, usualmente mais caros, de mochila cargueira que vêm com a de ataque acoplada.

2. Planejamento

Como primeiro mochilão, é importante ter um mínimo de planejamento: saber quando começar e terminar a viagem, quantos dias ficar em cada cidade, onde se hospedar e como se locomover entre os destinos.

Essa organização ajuda você a comprar passagens mais baratas, encontrar hospedagens em lugares mais estratégicos e avaliar se vale viajar de trem, carro ou bike entre as cidades.

Há viajantes, inexperientes ou não, que preferem organizar praticamente tudo, como os passeios dia a dia e os restaurantes/bares que serão visitados. Assim como há aqueles que ignoram tudo isso e caem na estrada só com a data de partida, deixando a vida surpreender.

3. Conteúdo da mala

Independentemente de quantos dias você ficará na estrada, a ideia é que leve o essencial na mochila.

Pense em roupas que tenham várias combinações e ignore aquelas que só podem ser usadas num único conjunto. De que adianta levar sapatos de salto alto para uma eventual balada? Tênis ou sapatos mais arrumadinhos podem ser usados tanto na festa quanto no dia a dia.

Avalie a ideia de lavar roupa durante a viagem –há hostels que oferecem lavanderia. Assim, você pode diminuir a quantidade de camisetas, meias e cuecas/calcinhas.

4. Burocracia

Pesquise o que é necessário levar de burocracia para seus destinos. Para onde você vai precisa de visto? E vacinas? Se a ideia é dirigir, precisa ter uma carteira internacional de habilitação?

Não é necessário viajar com passaporte entre os países do Mercosul, por exemplo. Em contrapartida, há um caminho burocrático para obter o visto chinês e o japonês. Ninguém quer estragar a viagem por causa de falta de papéis, certo?

5. Aplicativos 

Se você mochilou há 10 anos ou mais, é grande a chance de ter viajado sem tecnologias à mão, só a base de mapas e frases em diferentes idiomas anotadas num caderninho.

Mas, se vai fazer seu primeiro mochilão agora, por que não aproveitar os muitos aplicativos e baratear a trip? Seguem alguns que podem ser úteis, mas vão depender o perfil de cada um:

Couchsurfing – conecta pessoas que buscam abrigo gratuito ou um simples passeio na cidade com quem tem espaço em casa para oferecer

Hostelworld – assim como muitos outros sites/aplicativos, lista hostels na região que você estiver buscando

BlaBlaCar – conecta motoristas que têm vaga no carro com pessoas atrás de carona. A viagem é paga, mas sai mais barato do que transporte coletivo

Skyscanner – ajuda a pesquisar preços de passagens aéreas, assim como outros

6. Mente aberta

Não importa se a viagem é de mochilão, lua de mel ou a trabalho –na verdade, vale pra vida toda–, é fundamental estar sempre de cabeça aberta. Você vai encontrar pessoas de culturas e atitudes diferentes das suas, e isso é normal. Tente não as julgar por isso.

Problemas podem surgir. Quem nunca se encantou com um quarto de hotel quando viu na internet e descobriu algo bem diferente in loco? Ficou sob chuva todos os dias que passou no lugar? Ou viajou com uma péssima companhia? Pode ser difícil na hora, mas não deixe isso interferir na sua viagem e no seu sentimento sobre a cidade. Reveja o que você não gostou do lugar e avalie dar uma segunda chance ao destino.

História pessoal: Antes do meu primeiro mochilão pela Europa, fiquei alguns dias em Paris. Teve chuva, recepcionista mal-humorado, três tentativas de golpe e até uma madrugada em que dormi na rua. Levei muito tempo para ver que a situação ruim foi em parte por minha falta de experiência, e já cogito uma segunda chance à capital francesa.

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Aviso aos passageiros 1: Relato como foi o meu primeiro mochilão e todos os perrengues no livro recém-lançado “Embarque Imediato” (O Viajante, R$ 39,90, 180 págs.)

Aviso aos passageiros 2: Já contei aqui a história de dois mochileiros, o Davi, jovem que viajou pela África e pelo Oriente Médio, e o Samuel, PM aposentado que desbravou a América Latina com uma mochila nas costas

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Policial aposentado viaja de ônibus pela América Latina com mochila nas costas https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/11/11/policial-aposentado-viaja-de-onibus-pela-america-latina-com-mochila-nas-costas/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/11/11/policial-aposentado-viaja-de-onibus-pela-america-latina-com-mochila-nas-costas/#respond Mon, 11 Nov 2019 13:37:51 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2019/11/15734230985dc887faf3953_1573423098_16x9_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=168 Muita gente acha que viajar com uma mochila nas costas ou enfrentar perrengues fora de casa é coisa de “jovem sem juízo”. Samuel do Lago está aí para mostrar que não é bem assim.

Como ele começou a trabalhar cedo, aos 8 anos, teve a oportunidade de se aposentar aos 50.

Em um primeiro momento, o policial aproveitou a aposentadoria precoce e passou 13 meses na estrada, viajando pelo Brasil.

Depois, aos 52 anos, voltou a colocar a mochila nas costas para desbravar a América Latina, de ônibus. E foi nessa idade que ele descobriu o mundo de hospedagem em hostels.

Fez alguma viagem recentemente e quer compartilhar sua história? Mande seu relato para blog Check-in pelo email checkin.blogfolha@gmail.com.

*

Aos cinquenta anos já estava aposentado. Parece cedo, mas comecei a trabalhar aos oito. Não tive acesso, nos momentos ditos convencionais, a parte das brincadeiras de criança e quase todas as aventuras que os jovens fazem.

A aposentadoria expôs a fragilidade de um casamento que se arrastava e, com o divórcio, decidi começar tudo de novo.

Perigosamente livre, tive que reunir forças para encontrar o equilíbrio emocional que a profissão e o casamento tinham fragilizado e viajei para o interior paulista para refletir sobre o que faria da vida.

Estava dentro de um hotelzinho barato, após perambular pelas cidades próximas a Rio Claro, quando um amigo me ligou de Salvador informando que na emissora em que trabalhava precisavam de um repórter com o meu perfil. Imediatamente fechei a conta, voltei pra casa, arrumei as malas e fui. De mudança.

Recomeçar a vida numa cidade festiva como a capital baiana era tudo o que o novo solteirão da praça precisava. Mas de bom mesmo foi só a coragem que o convite deu para mudar de estado, pois ao chegar em solo soteropolitano a possibilidade de emprego não se concretizou. Ao menos ganhei o impulso necessário para realizar um antigo sonho que era conhecer todo o país. E assim, durante 13 meses e nove dias, percorri, literalmente, do Oiapoque ao Chuí.

Samuel quis viajar de ônibus pelas Américas para conhecer geograficamente o percurso (Arquivo pessoal)

Ao retornar a São Paulo, sem casa, sem mulher, mas com doze irmãos, fui para casa de um deles e permaneci lá durante os festejos de final de ano. Depois, fui morar em Resende (RJ), onde havia passado minha infância.

Lá, aluguei uma casa do século 19, de quase 300 m², onde ocupava o tempo escrevendo o livro sobre a viagem pelo Brasil.

Havia passado nove meses e a monotonia de uma cidade interiorana me incomodava, mas não tinha verba o suficiente para uma nova jornada. Contudo, o tédio me deu ousadia. Imaginei: se sobrevivo aqui com a pouca renda que tenho, também consigo por lá, basta ter o dinheiro extra das passagens de ônibus. E assim comecei a pôr em prática o planejamento de uma viagem pela América do Sul mochilando.

Fui a uma loja da cidade, comprei um saco de dormir e alguns acessórios básicos, passei em São Paulo para me despedir da família e segui viagem no dia 1º de setembro de 2012, aos 52 anos.

Da capital paulista fui para o Paraguai.

A opção de fazer todo o percurso até a Venezuela de ônibus era motivada pela minha resistência a avião e pela oportunidade de conhecer geograficamente o percurso.

Depois de viajar toda a noite sem pregar os olhos, ansioso, imaginando o que aquela aventura me reservaria, cheguei sonolento pela manhã na rodoviária de Assunção. Ao fazer o câmbio, percebendo minha desatenção, consideraram os cem dólares que pedi para trocar por guaranis como sendo reais e, assim, meus parcos recursos foram desfalcados.

Seria minha primeira experiência me hospedando em hostel, o que criava uma certa expectativa, mas logo descobri que o ambiente é uma extensão da própria casa. A diferença é a convivência diária com pessoas de nacionalidades e culturas diferentes, além de dormir no mesmo quarto com elas.

Embora nunca tivesse estudado espanhol, foram cinco dias em solo paraguaio com passeios e conversas agradáveis, mesmo com a limitação da língua.

Finalizei minha visita ao Paraguai com uma cantoria com a família da proprietária do hostel que, inevitavelmente, inclui “Galopeira” no repertório.

O destino seguinte foi o Uruguai e, embora já me sentisse confortável no papel de aventureiro e me considerando com alguma experiência em hostel, ainda assim não foi suficiente para escolher a cama: todas estavam ocupadas e só me restou a parte de cima de um beliche no meio do quarto.

O desconforto não prejudicou o convívio com os hóspedes, que foi enriquecedor. Tinha italiano, português, chileno, colombiano e, naturalmente, uruguaios.

Nícolas, um dos quatro irmãos que ajudavam o pai, proprietário, foi quem me recebeu. Para mostrar sua generosidade na hospedagem, me ofereceu uma cerveja enquanto falava do seu país. A atitude foi tão significativa que, dois anos depois, os recebi em minha casa, em Resende.

Ficar à vontade naquele ambiente festivo favoreceu para que eu praticasse o espanhol e entre tantas palavras aprendidas, chamou-me a atenção o quanto demorei para aprender que “ayer” significava “ontem”.

Uma semana depois já estava na Argentina e, sete dias depois, no Chile.

Dos dias em Santiago, impressionou-me ver todas as casas com a bandeira do país. Era semana da pátria e, embora fosse por força de lei, uma chilena disse que mesmo que não fosse obrigatório eles fariam, por amor e respeito ao país. Achei bonito o patriotismo.

Rumo a Oruro, na Bolívia, pernoitei no deserto chileno de Atacama. Das hospedagens, ao final da viagem, classifiquei como a pior.

Como das vezes anteriores, já havia pesquisado pela internet onde ficaria, mas encontrar duas paulistas no ônibus trouxe um pouco do alento de estar entre os meus e, por isso, decidi mudar a opção para acompanhá-las no hostel Mamut.

O calor e cerca de dez beliches todos ocupados, num quarto onde ficavam homens e mulheres, só não foi pior porque restou-me um colchão de casal, no chão, onde tentei dormir.

Perto de uma da madrugada chegou um cidadão tropeçando nas coisas e procurando sua cama. Acomodou-se na parte de cima do beliche em que estava uma das paulistas. Me pareceu embriagado. Nem bem deitou e começou a roncar. Ronco alto. Intercalado por flatulências no mesmo volume. Foi desconcertante, mas não tinha pra onde ir, já estavam todas as dependências ocupadas. Então restou-me esperar que a noite não fosse tão longa.

Ao amanhecer, conversando com a brasileira que dormiu no mesmo beliche do rapaz inconveniente, confidenciou-me que sentia um mau cheiro, mas estava tão cansada que não conseguiu acordar.

A altitude que já sentia no Atacama só aumentou ao passar por Oruro e La Paz, na Bolívia, Cusco e Machu Picchu, no Peru, e Quito, no Equador. Ao chegar à colombiana Bogotá já me sentia ambientado.

No trajeto de Cusco para Machu Picchu, tomei vários comprimidos, mas não foram suficientes para conter o aumento da pressão arterial. Aproveitei-me da companhia de um médico cubano, que dividia comigo a poltrona do trem, na esperança de uma solução para o meu problema. Após contar a quantidade de comprimidos que havia ingerido, limitou-se a dizer que era “demasiado”.

A escolha da poltrona

Na hora de comprar as passagens, fazia a escolha da poltrona repetindo o hábito adquirido na viagem pelo Brasil de sentar-me na de número 24.

Por ficar no centro do ônibus e no corredor direito, intuí que se houvesse um acidente, batendo de frente ou por trás, sofreria um impacto menor. Se fosse pela lateral também, já que estava do lado oposto ao tráfego. E, por fim, também me livraria do incômodo de sentir necessidade de ir ao banheiro e ter que acordar o passageiro ao lado.

Todavia essa técnica não fez nenhum sentido no trajeto de Cusco para Lima. A viagem de quase 24 horas transcorreu por rodovias tão perigosas que um acidente livraria apenas quem não estivesse embarcado.

Na saída do Equador e entrada na Colômbia experimentei o desconforto de ter que encarar o motorista do táxi, que queria superfaturar em quase cinco vezes a corrida, apenas pelo fato de ter saído duas quadras do itinerário, para sacar dinheiro num caixa eletrônico. Ainda assim acabei pagando o dobro do combinado, mas com a sensação de que corria risco em terra estranha.

Samuel do Lago em frente à placa da Colômbia (Arquivo pessoal)

O outro perrengue se deu na chegada à Venezuela.

Troquei os poucos pesos colombianos que tinha por bolívares e, ao chegar a San Cristóbal, me dirigi a um hotelzinho popular ao lado da rodoviária, paguei o pernoite, deixei minha mochila e fui sacar dinheiro, mas não consegui nos três únicos caixas que havia na cidade. Então restou-me apenas o dinheiro do jantar e, para o dia seguinte, teria que buscar solução para seguir a Caracas.

Salvou-me o contato virtual com uma venezuelana, residente na capital. Pela manhã, lhe falei sobre minha dificuldade e ela começou a buscar na cidade alguém que pudesse me ajudar, já que estava a cerca de oitocentos quilômetros.

Na hora do almoço, a fome veio acompanhada da insegurança de estar onde não conhecia ninguém, longe de casa. Então tive que potencializar meu limitado talento para ator e representei uma fome de quem não comia havia um mês. “Yo tengo hambre”, “Tengo plata, pero cachero no acepta mi tarjeta”. O timbre grave e o tom de voz em pânico mereceu o alento de uma senhora, que aguardava na recepção do hotel seu esposo descer.

– Calma, señor, que pasa? Lhe explicava quando o esposo chegou. E assim ela lhe convenceu a me dar uns trocados.

Repeti a cena com o dono do restaurante, pois o dinheiro não era suficiente, e consegui um prato de comida.

Eram três da tarde quando chegou uma senhora distinta, com seu filho pequeno, e me levou de carro até a rodoviária, comprou-me a passagem e ainda me ofereceu uns trocados para eu comer na viagem. Era a esposa de um político local que a minha amiga virtual contatou. Depois descobri que a minha conhecida era influente politicamente no país.

Minhas despesas eram muito controladas, não permitia qualquer exagero, pois poderia faltar no momento seguinte.

Ao todo, Samuel do Lago já visitou 34 países (Arquivo pessoal)

No Chile, próximo ao hostel que me hospedara vi numa placa “Minuta a lo pobre”. Chamou-me a atenção o nome e o preço. Pedi informação ao garçom e ele explicou que o prato de arroz, bife, ovo, batata frita e salada era bem servido. “Los pobres comen largo”, explicou. Ali fazia todas minhas refeições. Tomava o café da manhã que era oferecido no preço da diária do hostel e protelava ao máximo o horário do almoço, para pular o jantar. Mas a possibilidade de ficar também sem o almoço em San Cristóbal me desestabilizou emocionalmente.

No trajeto para Caracas, já com clima nostálgico de quem finaliza a viagem, fiz um balanço, refletindo sobre tudo que havia experimentado e, ao desembarcar do ônibus, fui direto ao caixa eletrônica. Desta vez tive outra grande surpresa que mudaria a história da viagem. Ao verificar o saldo, descobri que tinha dinheiro para dar a volta ao mundo, se quisesse. Assustado com o equívoco que o banco poderia ter cometido, falei com meu irmão, em São Paulo, e fui informado que aquele valor se referia a uma ação judicial trabalhista que havia ganho. Alegre, devolvi o dinheiro que a amiga emprestou e ainda lhe ofereci um almoço que, para a minha surpresa, ficou num valor quase equivalente a todas refeições que tinha feito na viagem, por conta dos vinhos.

Ânimo revigorado, avaliei que nunca estivera tão perto do México, por isso seguiria viagem. E assim entrei na América Central, percorrendo todos os países até chegar à terra dos maias, numa viagem que durou três meses e na qual colecionei muitas emoções, porém diferentes das que tinha vivido ao longo dos 30 anos trabalhando como policial em São Paulo. A experiência foi tão envolvente que pouco tempo depois já estava novamente em viagem. Desta vez pela Europa. Somando as viagens anteriores, atingi a marca de 34 países visitados.

*

Aviso aos passageiros 1: Outro brasileiro que está viajando pela América Latina é o Guilherme Valadão, que relatou como foi viajar de bicicleta por Brasil, Colômbia e Venezuela

Aviso aos passageiros 2: O casal Alessandra e Leo também estão rodando pela América Latina, mas de carro. Aqui, eles contam por que adotaram o acampamento como estilo de viagem

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Mochileiro cearense conta como é viajar pela África e pelo Oriente Médio https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/09/25/mochileiro-cearense-conta-como-e-viajar-pela-africa-e-pelo-oriente-medio/ https://checkin.blogfolha.uol.com.br/2019/09/25/mochileiro-cearense-conta-como-e-viajar-pela-africa-e-pelo-oriente-medio/#respond Wed, 25 Sep 2019 13:32:48 +0000 https://checkin.blogfolha.uol.com.br/files/2019/09/15693699045d8aaf30baec8_1569369904_3x2_md-300x215.jpg https://checkin.blogfolha.uol.com.br/?p=120 Já apresentei aqui o Lucas e a Eve, um casal brasileiro que está rodando pela Europa em um motorhome, o Rogerinho. Agora é a vez de mostrar a história do Davi Montenegro.

O mochileiro cearense está há 1 ano e 3 meses em uma viagem ao redor do mundo. Ele começou o tour na Rússia, durante a Copa do Mundo de 2018, e passou 5 meses na Europa. Depois, ficou 1 mês no Oriente Médio e mais 8 na África. Agora, há pouco mais de 1 mês, Davi está desbravando a Ásia.

O cearense registra os locais por onde viaja, com impressões, perrengues e dicas, em sua conta no Instagram (@cabeca.pra.baixo). Inclusive, em muitas de suas fotos Davi está literalmente de cabeça pra baixo, plantando bananeira. A mania começou anos atrás, quando ele estava aprendendo a dançar break, o que o inspirou a fazer essa manobra nas imagens e virou tradição.

E você? Tem alguma história legal de viagem e quer compartilhar? Mande para o blog Check-in pelo email checkin.blogfolha@gmail.com

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Cheguei ao Oriente Médio em Tel Aviv (Israel). Uma cidade incrível, que une o antigo ao muito moderno, tudo isso no litoral do mar Mediterrâneo. Junto com dois amigos alugamos um carro e viajamos ao redor do país. O destaque ficou para a visita ao mar Morto, tão salgado que é impossível afundar! Você consegue boiar literalmente em qualquer posição. A sensação é muito esquisita.

Depois visitamos duas cidades na Palestina: Ramallah e Bethlehem. Dado que só ouvimos notícias trágicas sobre a região, eu estava com bastante medo. Chegando lá um pouco perdidos, fomos ajudados e muito bem recebidos pelo povo palestino. Pessoal muito feliz de que a gente os estava visitando, no fim do primeiro almoço nos deram de sobremesa até sorvete de graça. Ficamos num apartamento Airbnb muito bom e bem localizado e a experiência toda foi bem diferente do que eu esperava encontrar.

A última parada no Oriente Médio foi no sul da Jordânia, onde fui às Ruínas de Petra, uma das sete maravilhas do mundo moderno. É uma cidade histórica e arqueológica, com muito da sua arquitetura esculpido diretamente nas pedras, algo fantástico de se presenciar.

No fim de novembro peguei um navio da Jordânia que atravessou um trecho do mar Vermelho chegando na Península de Sinai, no Egito. Era minha primeira vez pisando em solo africano. A partir daí meu plano era atravessar o continente de norte a sul, tudo de transporte público, chegando à África do Sul provavelmente 5 a 6 meses depois.

Acabou que alguns destinos pelo caminho me encantaram tanto que eu fui ficando mais tempo do que o planejado, mas finalmente 8 meses depois cheguei na Cidade do Cabo, na África do Sul. No caminho entre o Egito até lá atravessei os seguintes países: Sudão, Etiópia, Quênia, Tanzânia, Maláui, Zâmbia e Namíbia.

Quando decidi fazer esse trajeto no continente, confesso que estava com um bom medo. Sabemos muito pouco sobre esses países, e as notícias que temos são na sua maioria negativas. Tive surpresas muito boas, vendo vários lados da África que nunca vemos!

No Sudão encontrei um país muito pobre, mas com um povo extremamente carismático. É provavelmente o local menos turístico de todos os que já visitei, então ver um estrangeiro para eles é uma surpresa e querem fazer de tudo para agradá-lo. Ganhei caronas e até sobremesas de graça!

Na Etiópia fui surpreendido com o nível de desenvolvimento da sua capital, Adis Abeba. Prédios sendo construídos por todos os lados na região central da cidade. Acabei sendo convidado por acaso na rua e indo parar no estádio de futebol para assistir a um jogo do Campeonato Etíope. O jogo em si foi meio fraco, mas a torcida deu um espetáculo cantando sem parar os 90 minutos.

No Quênia tive a oportunidade de fazer um safári, vendo de pertinho animais na savana, seu habitat natural. Alguns eram abundantes, e para todo lado você via zebras, girafas, búfalos, javalis, gazelas, antílopes. Já outros, mais raros, nosso grupo deu sorte de avistar: leões, um guepardo (cheeta) e um dos mais raros da região, um leopardo! Este estava de boa comendo uma gazela em cima da árvore, surreal.

Na Tanzânia visitei praias lindíssimas na ilha de Zanzibar, do nível de beleza do Caribe. Nunca associamos África com praia bonita, mas o litoral leste do continente está cheio delas! Mar azul clarinho, areia branca, água de coco e muita música africana, incluindo batucadas!

O Maláui é um dos mais pobres da África, mas com belezas naturais e um povo sorridente. A região das margens do lago Maláui (um dos maiores do continente) é muito linda, com montanhas de um lado e o lago gigantesco, que parece até o mar, do outro.

Na Zâmbia visitei as Victoria Falls (Cataratas de Vitória) que ficam na fronteira com o Zimbábue. É um paredão muito largo com quedas d’água, incrível. Quando fui, a água batia com tanta força lá embaixo que subia de volta em forma de névoa e chegou a formar dois arco-íris ao mesmo tempo!

Na Namíbia visitei a remota tribo local Himba, no meio de muitos quilômetros de deserto. Eles ainda vivem como se estivessem décadas atrás. Nunca tomam banho, bebem água de um poço e são semi-nômades, vivendo da cria animal e migrando dependendo da época do ano para onde tem alimentos para os animais.

Chegando finalmente à África do Sul, parecia que eu tinha mudado de planeta: um país extremamente desenvolvido. Viajei pela bonita costa sudoeste, conhecida como Garden Route. Ainda tive a sorte de ver a etapa sul-africana do mundial de surfe em Jeffrey’s Bay, torcendo para os nossos atletas brasileiros! Gabriel Medina foi o campeão da etapa.

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Aviso aos passageiros 1: Caso você esteja pensando em cair no mundo, ou mesmo ir de férias a um lugar e tem receio, inspire-se na história da aposentada Josefa Feitosa, uma cearense que está na estrada há 2 anos

Aviso aos passageiros 2: O leitor Marcelo Lemos contou a este blog como foi escalar o monte Kilimanjaro, o ponto mais alto da África

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